terça-feira, 3 de julho de 2018

Messi e CR7: a interminável discussão sobre quem é o melhor


Ao longo da história, é muito comum aparecer um ou outro jogador que é catapultado a melhor do mundo, quiçá a melhor de todos os tempos. Em geral, em épocas distintas: Pelé e Maradona representam bem a disputa, sem que existam elementos em comum para rivalizá-los. Como se não bastassem os argumentos de ambos os lados, temos um Brasil x Argentina que sempre desperta grandes discussões.

Agora, não. Os dois jogadores que dominam o futebol do planeta há dez anos pertencem à mesma geração. Cristiano Ronaldo tem 33 anos e Messi, 31. Um joga no Real Madri, o outro, no Barcelona, as duas principais equipes do mundo. Ambos praticam futebol sob as mesmas condições táticas, físicas e instrumentais (gramados em situação idêntica, a mesma excelência no material esportivo – chuteiras e uniformes de alta tecnologia). Portanto, há uma tendência que praticamente nos obriga a botar um acima do outro.

De partida, parece-me injusto comparar os dois com base nos títulos que conquistaram. Os troféus são êxitos de equipes, não de jogadores, ainda que um e outro tenham sido fundamentais nos respectivos triunfos madridistas e barcelonistas. O fato de Cristiano ter uma Eurocopa e Messi não ter conquistado a Copa América só prova uma coisa: Portugal tem obtido melhores desempenhos e resultados do que a Argentina. Nada a mais que isso. O máximo que podemos fazer é identificar qual foi mais decisivo nas conquistas de seus respectivos clubes. Sinceramente, não consigo distinguir ambos neste quesito, uma vez que Messi parece ter sido mais fundamental às conquistas do Barcelona até um certo momento da carreira, mais precisamente 2015, enquanto Cristiano Ronaldo o faz desde então.

[Fonte: www.soccerinfomania.com]
Analisando cada um, comecemos com Cristiano. Ainda que com um início de carreira promissor, já despontando como bom atleta na seleção portuguesa e no Sporting, com menos de 18 anos, ninguém apostava que o gajo fosse virar o jogador que virou. A mudança de patamar ocorreu em 2009, quando decidiu sair da Inglaterra e atuar na capital espanhola, embora àquela altura CR7 já ostentasse um troféu de melhor jogador do mundo conquistado um ano antes defendendo o Manchester United. Ao se deparar rotineiramente com Messi, estando no maior rival do Barcelona, o português foi desafiado – e se desafiou – a aprimorar o seu jogo. O egocentrismo do português recebe bem os desafios que se apresentam.

Costumo dizer que se Cristiano não tivesse mudado de ares ou não comprasse a disputa com Messi, correria sérios riscos de ser um jogador que chamasse a atenção por atributos fora da alçada do jogo propriamente, algo muito próximo do que foi, por exemplo, David Beckham. Cristiano se propôs a superar limites, enquanto o inglês atuou pelo estrelato puro e simples. Cada um faz as escolhas que lhe parecem mais convenientes, de modo que é só olhar à distância a carreira de ambos para concluir aquilo que se insinua como óbvio: o português já está na seleta lista dos melhores da modalidade. Beckham já se perdeu na história.

Cristiano marca o segundo gol do Real contra o Barça na final da Supercopa da Espanha 2017
[Vídeo: Youtube]

A excelência do futebol de Cristiano proveio de muito esforço. Como já dito, até certo ponto da carreira o gajo era mais firula do que beleza, era mais marketing do que jogo. Os treinamentos excessivos e o perfeccionismo de quase todo egocêntrico fizeram dele o jogador mais completo que vi jogar: chuta bem com os dois pés, é exímio cabeceador, tem ótimos domínio e passe. Em suma, domina como ninguém os principais fundamentos do jogo. O grande mérito de Cristiano não é ter cinco prêmios de melhor do mundo – com grande chance de conquistar o sexto em outubro – sem que alguém supusesse isso. A virtude do português é se colocar na mais nobre disputa do futebol, sem que se pudesse prever tal feito.

Já Messi tem outras peculiaridades. Enquanto o jogo de Cristiano é baseado na velocidade e na força, tornando o seu repertório previsível, os movimentos de Messi são surpreendentes. Trata-se de um futebol mais vistoso, plástico, genial. Ou seja, o argentino é mais talento que treino, de modo que a atuação de Messi é baseada no insight, no improviso, e por isso é encantador vê-lo em campo. Surpreende o amante do futebol a todo momento.

Messi abre o placar na final da Copa do Rei, em 2015, contra o Athletic Bilbao
[Vídeo: Youtube]

A dinâmica do seu jogo concatena virtudes dos grandes jogadores da história: alta velocidade, controle da bola muito próxima ao pé em movimentos progressivos, a ponto de cada passo (curto) da corrida representar um toque na bola. Outro fator que potencializa a capacidade do argentino: Messi inverte a direção da corrida com facilidade impressionante, o que torna ainda mais difícil a tarefa de alguém abortar a sua jogada.

Como o futebol é modalidade esportiva coletiva, seria injusto atribuir só a Messi o sucesso do seu jogo. O melhor momento da sua carreira veio com o técnico Pep Guardiola, entre 2008 e 2012, hoje treinador do Manchester City. Na véspera de um duelo com o Real Madri, já de noite, Guardiola ligou para Messi. O telefonema era para informar ao craque que o Barcelona jogaria aquela partida sem centroavante, dando ao argentino a função que ficou conhecida como “falso 9”. Nesta posição, Messi atuaria de forma centralizada entre os volantes e os zagueiros adversários. O resto é história: em pleno Santiago Bernabeu, o Barcelona enfiou 6x2 no Real Madri, em maio de 2009, com atuação estupenda do argentino.

Real 2x6 Barça: o jogo que mudou o patamar de Messi e estabeleceu novos parâmetros no futebol, graças a Guardiola
[Vídeo: Youtube]

Depõe contra Messi, especialmente no atual momento, que ele dá mostras de que já atingiu o auge, e agora passa pela trajetória descendente da carreira, ao contrário de Cristiano, que, justamente aos 33 anos, vive o seu melhor momento. Raro no histórico dos jogadores de futebol, uma vez que já considerada idade tardia.

O problema das comparações entre Messi e Cristiano é que, invariavelmente, os defensores de um julgam necessário desmerecer o outro. É a mesma mania do liberal que diminui Marx, assim como parte da esquerda o faz com Adam Smith. O bom senso recomenda botar ambos no panteão dos grandes pensadores, de sorte que preferir um a outro está mais ligado à identificação do que a critérios objetivos.

A discussão majoritária entre quem ama futebol é o velho maniqueísmo de um ou outro. Como se não fosse possível entender que ambos são brilhantes, e baita honra a nossa ter a possibilidade de ver os dois a todo momento. Talvez quando Messi e Cristiano encerrarem suas carreiras e a gente fizer o exercício de olhar para trás, haverá mais requisitos à nossa disposição para um comparativo menos injusto. Ainda assim, se a dúvida pairar e alguém entender que a minha opinião é importante, direi aquilo que já afirmei quatro anos atrás: regozije-se a Messi.