O papel amassado, a tinta borrada e os dedos manchados
denunciavam: aquela carta fora lida diversas vezes. Ela revisava frase por
frase, uma palavra após a outra, na expectativa de ser dissuadida por um
desfecho contrário ao que ficara explícito. Ela relia o parágrafo único sem
resignação, como quem procurava uma linha a mais que portasse um “todavia”, um
“porém ou um “mas”. Mas, não. A companheira, a mesma com quem enfrentara o
preconceito da família e de toda a sociedade, partiu. O que tornava tudo tão
incompreensível era o fato de não ter havido o olho no olho, uma troca qualquer
de palavras. Talvez tivesse doído menos ouvir um “acabou, não te quero mais”. A
escrita, ao contrário da oralidade, deixa em aberto o verdadeiro sentimento que
motivou a atitude: “estaria ela com raiva, hesitante, decidida?”. Cada lágrima
enxugada carregava consigo a esperança de não ter lido acertadamente o final
trágico ou de encontrar uma explicação que pudesse ser esclarecida, e tudo
voltaria a ser como sempre foi. Mas, não. Não existia um motivo lógico ou
evidente: a mulher, que até a leitura da carta fora sua, deixou-a para não mais
sê-la, não obstante uma lembrança terna da felicidade que se esvaiu.
Simplesmente, acabou, como pode ser finito qualquer amor incapaz de se
reinventar.