Se alguém te
pedir pra fazer uma lista com as cinco coisas de que você mais gosta,
certamente o sexo estará entre elas.
Possivelmente, ele se encontrará nas três primeiras. É muito provável que
encabece a relação. Exceto ao mais imaculado dos corpos, é inegável que a
experiência sexual é a perdição da carne, a prova cabal de que o espírito se
rende à matéria. E tudo seria mais triste se de outra forma fosse.
O sexo, que no
princípio da existência humana (ainda completamente primitiva e selvagem) era
usado pelo homem – e só por ele – para saciar uma necessidade, passou a ser
usado para perpetuar a espécie, fruto do desenvolvimento da inteligência do homo sapiens. Só depois, o homem
entendeu que era também direito da mulher sentir prazer. Nada mais justo,
então, dizer que a posição de 4 é
antecessora do papai e mamãe.
Mas por que algo
tão bom às duas partes – incluindo aí, claro, as relações homossexuais – é ao
mesmo tempo excessivamente profano? Em que momento da história o ser humano
convencionou que o sexo deveria ser às escondidas, ao contrário do beijo e do
abraço? Não defendo a ideia de socializar a relação, com o ato na rua, à base
de ingresso cobrado junto à plateia voyeur. Mas o fato é que, num dado momento,
acordou-se que o sexo deveria ser de âmbito íntimo.
A própria
mentalidade de perpetuar a espécie e, como conseqüência disso, constituir
família pode ter contribuído para se enclausurar o sexo. É como se transar às
escondidas passasse a preservar moralmente um ato que, agora, não é mais uma
forma de desafogo das excitações, mas o sustentáculo de um projeto de vida que
prevê continuidade. A casualidade era propensa ao publicismo. O compromisso
parece inibir.
Um outro peso em
favor da blindagem da ação sexual pode ter sido a religião. O motivo é simples:
as convenções morais, que normalmente se calcam nos dogmas de fé, são
impiedosos com a mulher. Razão pela qual a obrigatoriedade de se casar virgem,
de não abandonar o macho que a agride, de não poder trabalhar, estudar, votar,
de ser obrigada a se contentar com a traição do marido era – ou ainda é – da
mulher.
Aos olhos da
tradição judaico-cristã, o sexo virou algo profano a partir de Eva. No jardim
do Éden, foi ela a dar o fruto proibido ao “ingênuo” Adão, e se, até pouco
tempo atrás, os dedos recriminavam a mulher, foi por causa disso. A ideologia
machista, legalizada pelas Escrituras (especialmente no Velho Testamento),
obteve tamanho poder, que não foi incomum num passado recente ver mulheres
julgando uma semelhante sua.
Em momento
posterior, já na Era Cristã, Jesus foi descrito como casto, aquele que se
dedicou exclusivamente à causa. Como se alguém ao seu lado fosse se configurar
em um empecilho, a atrapalhar a consumação da profecia. Se o nazareno tivesse
se relacionado com Madalena – hipótese levantada por quem contesta passagens da
Bíblia –, o sexo certamente seria visto, hoje, como algo menos proibido e
pecaminoso. E, convenhamos, não botaria em xeque, um milímetro sequer, a base
da cristandade.
Se a referência
for o Islamismo, tudo é ainda mais severo. De novo, a figura da mulher é
central, e ela é resguardada excessivamente pelas regras rígidas (que, muitas
deles, não são arbitradas por Deus ou Alá, mas sim pelos homens de má fé). As
roupas, que cobrem o corpo todo, provam que a mulher detém uma liberdade física
menor que o homem, a ponto de ser apedrejada – voltamos ao que de pior havia no passado? – em caso de traição ao marido. Na possibilidade
inversa, o homem é preservado.
Na mitologia
grega, o mesmo. Outra vez, a mulher como figura inferior ao homem. Pandora, a
primeira mulher, mandada por Zeus como forma de punição à desobediência do
homem, portava consigo uma caixa. No objeto, somente coisas boas, que deveriam
ser ofertadas ao mundo apenas depois da ordem suprema. Incapaz de esperar, a
curiosidade fez com que ela abrisse a caixa, soltando ao léu o que de pior
poderia acometer a espécie humana.
A religião, mais
por culpa dos homens que a interpretam, pode ter induzido o sexo à intimidade.
A própria auto-censura, à que está submetida a consciência humana, também deve
ter a sua parcela de culpa na escolha do ambiente fechado. Independente do
fator histórico que tenha levado a transa para dentro de quatro paredes – ou do
banco do carro estacionado em local isolado –, o melhor mesmo é fazer sem
ninguém por perto. Qualquer intruso pode atrapalhar um dos poucos momentos que,
a cada vez que é executado, concede uma sensação diversa, impagável, algo que
oferta mais prazer a quem sente, e não àquele que vê.