Quando eu tinha 5
anos, tudo era diferente. O que me permite usar a expressão “no meu tempo...”,
qualquer coisa que denote uma certa velhice de quem fala.
No meu tempo, os
telefones públicos, os quais denominávamos orelhões,
eram de duas cores: um vermelho, para se fazer uma ligação local; outro
azul, que usávamos para falar com quem morava fora, só interurbano. Nada de
cartões, como hoje. Era tudo na base da ficha. Se não botasse a dita cuja na hora
certa, o contato caía e a ligação deveria ser refeita.
No meu tempo, não
se jogava vídeo-game pelo computador ou usando disco. Naquela época, nem
computador havia – ao menos para a classe média emergente. Os jogos de que
desfrutávamos estavam nos cartuchos (ou fitas) do Atari. O meu não era Atari.
Era Dactar. Mas as fitas de um cabiam no outro, e era uma festa maluca jogar
Enduro ou River Raid. Depois vieram os aparelhos mais modernos: Master Sistem, Mega Drive e Super Nintendo.
No meu tempo,
quando tocava a vinheta do “Plantão” da Globo, era aumento do combustível na
certa. Sempre “a partir da meia-noite”. Lá íamos meu pai e eu ao posto, já
noite, pra pegar a “gasosa” ainda mais barata. No mercado, os rapazes com as
“maquininhas de preço” nas mãos, várias vezes no mesmo dia, denunciavam que a
inflação era galopante, e o Brasil não se insinuava como hoje.
No meu tempo, a
gente não entrava em aeroporto e shopping. No lugar onde só rico pisava, a
classe média passava longe. Quando entrava, era só pra conhecer. Congonhas, pra
mim, era apenas atração turística. Quem andava ali era magnata, o mesmo que
portava os primeiros celulares, os tijorolas.
Os que andavam pelas ruas falando aos celulares eram vistos com reverência,
porque “só gente rica usa telefone móvel”.
No meu tempo, não
tinha injeção eletrônica nos automóveis. Tinha o “afogador”, um comando do
carro junto ao painel que eu puxava logo depois de dar a partida. Afinal, antes
do meu pai sair, era necessário botar o veículo pra funcionar alguns minutos: era
recomendado pôr a bagaça em movimento só depois de ficar um tempo ligado. Ah, é
claro: antes de dar a partida, nunca deixava de pisar umas quatro ou cinco
vezes no acelerador, justamente para que o combustível fosse injetado do tanque
ao motor. Do contrário, não pegava. Quando isso ocorria, no meu tempo, a gente
soltava na “banguela” pra pegar no tranco.
No meu tempo, não
se ouvia música “baixada”. Era no vinil (LP), depois na fita cassete (K7. Por
gentileza, não pense bobagem), até que veio o CD. A primeira fita de que me
lembro adquirir foi Thriller, de MJ.
Assim como o vinil, tinha o lado A e lado B (o único LP que tive foi da Xuxa.
Sim, isso é motivo de muita vergonha, algo que gostaria de extirpar da minha
infância). Só com o CD que se parou com aquele negócio de vira aqui, vira ali.
O meu primeiro disco compacto? Mamonas Assassinas, a banda que gravou um único
disco, mas que foi febre no país inteiro.
No meu tempo, a
gente não assistia Avatar, Harry Potter, “Saga” Crepúsculo e Senhor dos Anéis.
Naquela época, era Rambo, Comando para matar, Rocky e Top Gun. Blu-Ray, DVD?
Nada! Era fita, amigo. Daquelas que quando o filme chegava ao fim, a gente
tinha que rebobinar. Era a pré-história, algo de que não nos dávamos conta, e
que hoje causa uma deliciosa nostalgia.
No meu tempo, eu
ia pra rua jogar bola. Na terra, na grama, no cimento, sempre descalço. Também
andava de bicicleta e nadava. A tecnologia não me corrompia, assim como
corrompe a moçada de hoje. Talvez porque naquela época esses equipamentos que
encantam, facilitam e sedentarizam (seria esse um neologismo?) não podiam ser
comprados tão facilmente. Mas creio que eu não trocaria meus carrinhos de fricção
por nada.
No meu tempo, homem
que era homem fazia a declaração do imposto de renda no papel. Preenchia o
formulário todo – primeiro a lápis, depois à caneta – e entregava numa agência
bancária. Havia qualquer coisa romântica em todo aquele primitivismo. Hoje é
tudo muito sofisticado.
No meu tempo, os
desenhos eram outros. Não sei os que passam agora, mas dificilmente Scooby Doo,
Popeye, Caverna do Dragão, Thundercats, Cavalheiros dos Zodíacos, Heman, atraem
as crianças de hoje. Elas já nascem evoluídas, praticamente falando, esnobando
a ideia de papai-noel, sem crer na magia dos desenhos. Mas quem disse que
desenho é só pra criança?
No meu tempo,
diziam que a rapariga saía do ensino médio pra fazer magistério. Ah, como as
moças daquela época sonhavam em ser professoras. Era quase que uma vocação
inata. Hoje, arrisque perguntar prum jovem do terceiro colegial se ele pretende
prestar vestibular pra virar professor. Não haverá uma mão erguida. Haverá,
sim, quem ria da pergunta impertinente, posto que ser professor é cultuar o
ridículo, é ganhar pouco, é não ser reconhecido, é apanhar da polícia quando reivindica
o básico.
No meu tempo se
fazia tanta coisa. O meu tempo não foi há tanto tempo assim. Mas parece que
sim. Me sinto tão velho...
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