O texto de hoje
vai pra você, que já caiu no falso discurso bondoso e compreensível da mulher
que está ao seu lado. Porque o tempo juntos, a longevidade do relacionamento,
faz com que a gente acredite que as nossas cagadas (todas elas) possam ser
perdoadas incondicionalmente. O pior de tudo é que cremos nisso, pois a outra
peça da relação assume que não te porá contra a parede, caso você confesse “um
crime”.
A situação mais clássica –
que já aconteceu comigo e deve ter ocorrido com você também – é quando passa
uma mulher ao seu lado, e a sua companheira, antes mesmo de você, nota que a
criatura em movimento é uma das coisas mais lindas que já pairaram na Terra. Sucede
a essa conclusão a velha pergunta manjada de toda mulher temerosa: “você achou
aquela moça bonita?”. Na sequência, a afirmação (também dela): “pode falar a
verdade, eu não vou ficar brava”. Aí é que mora o problema...
Porque a causa de
toda a guerra mundial do casal que virá após a sua resposta, caso ela seja
positiva, é justamente aquele adendo à pergunta, quase que de forma
despretensiosa, aparentemente sem querer (“pode falar a verdade, eu não vou
ficar brava!”), mas que é uma arma poderosa da mulher para “espremer” o macho
adiante (algo semelhante ao jargão policial “tudo o que disser poderá ser usado
contra você no tribunal”). E o homem – ou a outra mulher – da relação,
despreparado, desatento e inocente, cai feito um pato, cometendo o maior erro
que alguém pode praticar nessa situação: dizer a verdade.
Esta é uma
verdade que jamais pode ser revelada. Por mais inacreditável que seja a mulher a
desfilar ao seu lado, a deixar aquele perfume que ficará entranhado na sua
alma, não diga que a achou linda. Se possível, jure de pés juntos, joelhos no
milho e mãos-postas que nem sequer viu a moça. É evidente que não é correto
mentir, mas essa é uma pendenga que você resolverá com o Todo Poderoso só
depois, daqui a sabe-se lá quanto tempo. Enquanto o Juízo Final não vem, para o
bem da paz mundial, minta.
Essa é a famosa
mentira que protege a própria mulher e, claro, a si mesmo. Porque se a sua
resposta for “sim, eu achei aquela moça bonita”, dentro de poucos minutos a sua
querida companheira estará com a auto-estima lá embaixo, se achando a obra mais
cretina concebida pelo mundo, temendo que você irá largá-la para ficar com a
outra que acabara de achar apenas bonita. Sejamos realistas: a sua vida vai virar
um inferno, ainda que por pouco tempo. Em suma, achar outra pessoa bonita é algo
tão banal, posto que outras pessoas são inevitavelmente bonitas, mas tal
julgamento se transforma numa paranoia incontrolável na cabeça da mulher.
Temos, então, o
célebre efeito borboleta. Uma palavra
mal posta aqui, uma opinião não tão bem sucedida ali, um adjetivo atribuído ao
substantivo errado acolá, e bang! Toda
a lógica do tempo e dos acontecimentos premeditada por Deus é desestabilizada,
e já era a calmaria. Você será crucificado por uma boa porção de minutos. Por
isso, para evitar o caos, mesmo que ela venha com o olhar meigo e a voz doce,
brade a palavrinha que manterá em voga o bem de todos e a felicidade geral dos
dois: “Não! Não vi graça nela” ou um desprezível “Não! Nem reparei...”.
Do contrário,
você terá de desempenhar o trabalho psicológico que é inerente a quem se
relaciona com uma mulher: o de desfazer a tristeza e o ódio dela por você. Uma vez
que se você for frágil, cair na armadilha e responder “sim, achei a criatura
bonita”, você encontrará a sua amada desolada ou enfurecida e, logo após indagar “por que
você tá triste? O que aconteceu?”, ela te fará o maior culpado de todos os
tempos usando algumas poucas palavras: “você achou ela bonita...”.
Ocorre que toda
pergunta feminina (como a do tipo “você achou aquela moça bonita?”) é retórica:
ela indaga, só que exigindo de você a resposta que ela quer. É a única situação
em que uma interrogação não está aberta a várias possibilidades, e ai de você –
namorado, noivo, marido ou igualmente mulher – se não souber qual a resposta
correta a dizer. Nunca é demasiado recordar: só há uma mísera opção de resposta,
uminha da silva. É prudente, pois, que você esteja atento a ela, se quiser sair
ileso de uma discussão de relacionamento.
Em caso de erro –
e é importante lembrar que existe uma chance enorme disso ocorrer –, talvez
você tenha que perder o futebol de logo mais pra convencer a amada de que,
mesmo achando outras mulheres lindas, é ela que você quer, porque a outra, além
de não possuir metade da beleza dela, simplesmente não é ela, a pessoa em meio
a milhares que você escolheu para ficar ao seu lado a vida toda. Minta, admita
em silêncio a beleza da outra e confirme aos quatro cantos que, a despeito de
todas as maravilhas que te circundam diariamente, é a sua mulher que te faz
feliz como nenhuma outra.
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