Foi-se o tempo em que as falas evasivas, as narrativas forjadas e flambadas na mentira despudorada e o alerta ao inimigo imaginário davam conta da sede de riso. O apelo ao ridículo, aos subterfúgios toscos e às frases de mau gosto - quando não ofensivas a mulheres, homossexuais e negros -, já desgastado, agrada bem menos que outrora. Venerar ideias tortas como terraplanismo, vilipendiar a educação, vomitar impropérios contra a cultura e desdenhar do meio ambiente só afagam a sanha dos fanáticos, que, por natureza, não têm a menor noção do que seja o processo político e a sua manifestação mais louvável, a democracia. Os cães raivosos ainda ladram, é verdade, mas vão minguando. O extremismo temperado no ódio tem prazo de validade curto: a conta começa a chegar. Não adianta espernear: quem tem credenciais de miliciano jamais será estadista.
A encalacrada em que nos metemos ainda viverá os seus dias mais tristes. Sim, o pior está por vir, e o ministro da saúde, Luiz Henrique Mandetta, que despontava até ontem (17) como a fagulha de lucidez em meio a um bando de idiotas - cujo chefe dispensa apresentações -, já declinou. O único integrante do governo que valoriza a capacidade de pensar parece ter se rendido às frituras promovidas pelo "gabinete do ódio", um antro de disseminação de fake news que não perdoa os que fogem do script. A depender do presidente, criatura destemperada, despreparada e corrupta, o Brasil estará em maus lençóis. Façamos nós o trabalho que as lideranças se recusam a cumprir e evitemos enviesar a discussão: a Covid-19 não tem viés ideológico e acomete, indistintamente, liberais, conservadores e reacionários.
Não será fazendo arminha com as mãos, à base de conversa fiada ou com postura irresponsável, colocando em risco vidas alheias, que o Brasil irá superar o cenário preocupante imposto pelo coronavírus. Pode apostar: a bravata, o culto à ignorância e a retórica de "histerias" e "fantasias" não vão impedir que idosos sofram em demasia. As mortes já começam a surgir. É imperativo proteger as pessoas de idade. Rezar é ato bem-vindo aos que creem, mas, ante a gravidade da conjuntura, é preciso ir além.
Sem aptidão para manusear uma máscara,
Bolsonaro escancara o seu despreparo durante coletiva de imprensa concedida hoje (18) [Fonte: Twitter]
Sugiro dois movimentos: inteligência e empatia. Empatia para ter a consciência, mesmo sem a opressão da lei, de que é importante evitar aglomerações, pois ainda que não apresentando sintomas do vírus, é possível portá-lo e transmiti-lo a outras pessoas, aquelas dos grupos de risco (idosos, hipertensos, diabéticos, asmáticos). Empatia também para ter muito cuidado, mas não pânico: estocar alimento e outros produtos em excesso só vai deixar ainda mais vulneráveis as pessoas em condições socioeconômicas desfavoráveis. Se o problema é coletivo, atos de individualismo tendem a aprofundar a crise.
O outro vetor é inteligência. Inteligência para pensar táticas e propor investimentos que mobilizem o nosso aparato científico e tecnológico a dar respostas à propagação do vírus. Inteligência, igualmente, para articular as universidades públicas, centros de pesquisa e agentes de saúde em torno de um projeto que preze por ações concretas, não sem antes reconhecer que o panorama é grave, mas possível de ser revertido. Não se enfrenta e vence um desafio dessa amplitude fomentando idiotices e discursos desconectados do drama humano que vivenciamos. Em contextos como o atual, a incapacidade de liderar salta aos olhos, posto que se comportar como um sujeito caricato é dramaticamente insuficiente em tempos de fragilidades.
Outras crises dessa natureza vieram e foram superadas. China, país populoso e epicentro inicial do vírus, e Taiwan, nação vizinha e de tamanho menor, por exemplo, vão tendo êxito. Não à toa: investimento maciço em recursos que confrontam o problema em âmbito local, algo que só pode ocorrer se, a priori, houver um corpo de pessoas - do governo e da sociedade civil - que esteja disposto a refletir acerca das alternativas para virar o jogo, e agir. Mas é necessário que alguém dê a bandeirada indicativa de um caminho, função esta reservada ao principal representante da nação, em que pese o fato da cadeira da Presidência da República ser ocupada por um arremedo de gente.
Um cerrado com pequenas
árvores tortas e folhas secas caídas ao chão. Uma imagem bela que representa
tanta história de um povo sofrido que não deixou de lutar pelo seu território,
que foi tomado por fazendeiros grandes, que tiraram eles de suas terras. Onde o
solo tem sangue e suor de muitos descendentes que sofreram para manter seu
lugar para seus futuros filhos e netos. Um cerrado onde têm vários climas e
segredos que muitas vezes nem são revelados por ser um hábito guardar seus
costumes dentro de seus terreiros, onde tem cultura maior de vivência de um
povo que planta com alegria, mas, ainda no fundo, com aquele medo de sofrer
tudo o que já passou. Orgulho de ser negro que vai à luta sem perder seus
costumes e vivência de um povo feliz por estar em suas terras, de tempos que a
fé era única solução para acabar com aquela angústia de dor e sofrimento.
Sentados ao chão com armas em suas cabeças, único pensamento era rezar para o
seu protetor, um Santo com muita bênção.
Para obter experiência
transmídia e desfrutar de uma narrativa mais completa sobre o quilombo e seus
problemas e virtudes, acesse a CANÇÃO DO ORGULHO QUILOMBOLA, música composta e cantada por professoras e moradoras de Mata Cavalo, disponibilizada no Anchor.
*A crônica, composta por uma
estudante da Escola Estadual Professora Tereza Conceição de Arruda no quilombo
Mata Cavalo, é resultado de um trabalho colaborativo entre a comunidade e o
Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Arte (Gpea).
** Em virtude do sigilo
imposto pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP/Humanidades), Telegram é codinome
dado a uma das participantes da pesquisa de Doutorado [2016-2019] intitulada
“Fenomenologia transmidiática: cartografando o clima em Mata Cavalo”, cuja
autoria é de Thiago Cury Luiz, sob a orientação da Profa. Dra. Michèle Sato.
Seja ele feito ao sol, à
chuva, ao frio, à primavera.
A maior importância e o que
deve ser feito se fez.
--> Para obter experiência
transmídia e desfrutar de uma narrativa mais completa sobre o quilombo e seus
problemas e virtudes, acesse o perfil no Instagram [@thiago_c_luiz] e veja a
galeria de fotos sobre a ÁGUA. <--
*O poema, composto por uma
estudante da Escola Estadual Professora Tereza Conceição de Arruda no quilombo
Mata Cavalo, é resultado de um trabalho colaborativo entre a comunidade e o
Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Arte (Gpea).
** Em virtude do sigilo
imposto pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP/Humanidades), Snapchat é codinome
dado a uma das participantes da pesquisa de Doutorado [2016-2019] intitulada “Fenomenologia
transmidiática: cartografando o clima em Mata Cavalo”, cuja autoria é de Thiago
Cury Luiz, sob a orientação da Profa. Dra. Michèle Sato.
--> Para obter experiência
transmídia e desfrutar de uma narrativa mais completa sobre o quilombo e seus
problemas e virtudes, veja o vídeo do pôr-do-sol de Mata Cavalo, com o som dos
insetos ao fundo, disponibilizado no YouTube. <--
*O poema, composto por uma
estudante da Escola Estadual Professora Tereza Conceição de Arruda no quilombo
Mata Cavalo, em parceria com a Profa. Dra. Michèle Sato, é resultado de um
trabalho colaborativo entre a comunidade e o Grupo Pesquisador em Educação
Ambiental, Comunicação e Arte (Gpea).
** Em virtude do sigilo
imposto pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP/Humanidades), Twitter é codinome
dado a uma das participantes da pesquisa de Doutorado [2016-2019] intitulada “Fenomenologia
transmidiática: cartografando o clima em Mata Cavalo”, cuja autoria é de Thiago
Cury Luiz, sob a orientação da Profa. Dra. Michèle Sato.
Assim como esse vento da vida
pode bater em mim por meio de pétalas lindas, ele trouxe para mim amizades vivas
e inesquecíveis.
É engraçado como as coisas
acontecem: pessoas que jamais imaginava conhecer fizeram em mim flores brotar e
crescer.
Pessoas incríveis, que me
transmitiram essas sensações com sorrisos, abraços, fotografias, poesias,
músicas, palavras e olhares... e CLIMA!
Obrigada vocês, pessoas
lindas, por trazerem um colorido novo em minha vida.
--> Para obter experiência
transmídia e desfrutar de uma narrativa mais completa sobre o quilombo e seus
problemas e virtudes, ouça os bichos do quilombo Mata Cavalo, áudio
disponibilizado no Anchor. <--
--> Outra experiência possível ocorre acessando o perfil no Instagram [@thiago_c_luiz], na galeria de fotos sobre a AR. <--
*O áudio captado por uma
estudante da Escola Estadual Professora Tereza Conceição de Arruda no quilombo
Mata Cavalo é resultado de um trabalho colaborativo entre a comunidade e o
Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Arte (Gpea).
** Em virtude do sigilo
imposto pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP/Humanidades), Twitter é codinome
dado a uma das participantes da pesquisa de Doutorado [2016-2019] intitulada “Fenomenologia
transmidiática: cartografando o clima em Mata Cavalo”, cuja autoria é de Thiago
Cury Luiz, sob a orientação da Profa. Dra. Michèle Sato.
Ao longo da história, é muito
comum aparecer um ou outro jogador que é catapultado a melhor do mundo, quiçá a
melhor de todos os tempos. Em geral, em épocas distintas: Pelé e Maradona
representam bem a disputa, sem que existam elementos em comum para rivalizá-los.
Como se não bastassem os argumentos de ambos os lados, temos um Brasil x
Argentina que sempre desperta grandes discussões.
Agora, não. Os dois jogadores que
dominam o futebol do planeta há dez anos pertencem à mesma geração. Cristiano
Ronaldo tem 33 anos e Messi, 31. Um joga no Real Madri, o outro, no Barcelona,
as duas principais equipes do mundo. Ambos praticam futebol sob as mesmas
condições táticas, físicas e instrumentais (gramados em situação idêntica, a
mesma excelência no material esportivo – chuteiras e uniformes de alta
tecnologia). Portanto, há uma tendência que praticamente nos obriga a botar um
acima do outro.
De partida, parece-me injusto
comparar os dois com base nos títulos que conquistaram. Os troféus são êxitos
de equipes, não de jogadores, ainda que um e outro tenham sido fundamentais nos
respectivos triunfos madridistas e barcelonistas. O fato de Cristiano ter uma
Eurocopa e Messi não ter conquistado a Copa América só prova uma coisa: Portugal
tem obtido melhores desempenhos e resultados do que a Argentina. Nada a mais
que isso. O máximo que podemos fazer é identificar qual foi mais decisivo nas conquistas
de seus respectivos clubes. Sinceramente, não consigo distinguir ambos neste
quesito, uma vez que Messi parece ter sido mais fundamental às conquistas do
Barcelona até um certo momento da carreira, mais precisamente 2015, enquanto
Cristiano Ronaldo o faz desde então.
[Fonte: www.soccerinfomania.com]
Analisando cada um, comecemos com
Cristiano. Ainda que com um início de carreira promissor, já despontando como
bom atleta na seleção portuguesa e no Sporting, com menos de 18 anos, ninguém
apostava que o gajo fosse virar o jogador que virou. A mudança de patamar
ocorreu em 2009, quando decidiu sair da Inglaterra e atuar na capital espanhola,
embora àquela altura CR7 já ostentasse um troféu de melhor jogador do mundo
conquistado um ano antes defendendo o Manchester United. Ao se deparar
rotineiramente com Messi, estando no maior rival do Barcelona, o português foi desafiado
– e se desafiou – a aprimorar o seu jogo. O egocentrismo do português recebe
bem os desafios que se apresentam.
Costumo dizer que se Cristiano
não tivesse mudado de ares ou não comprasse a disputa com Messi, correria
sérios riscos de ser um jogador que chamasse a atenção por atributos fora da
alçada do jogo propriamente, algo muito próximo do que foi, por exemplo, David Beckham.
Cristiano se propôs a superar limites, enquanto o inglês atuou pelo estrelato
puro e simples. Cada um faz as escolhas que lhe parecem mais convenientes, de
modo que é só olhar à distância a carreira de ambos para concluir aquilo que se
insinua como óbvio: o português já está na seleta lista dos melhores da modalidade. Beckham já se perdeu na história.
Cristiano marca o segundo gol do Real contra o Barça na final da Supercopa da Espanha 2017
[Vídeo: Youtube]
A excelência do futebol de
Cristiano proveio de muito esforço. Como já dito, até certo ponto da carreira o
gajo era mais firula do que beleza, era mais marketing do que jogo. Os
treinamentos excessivos e o perfeccionismo de quase todo egocêntrico fizeram
dele o jogador mais completo que vi jogar: chuta bem com os dois pés, é exímio
cabeceador, tem ótimos domínio e passe. Em suma, domina como ninguém os
principais fundamentos do jogo. O grande mérito de Cristiano não é ter cinco
prêmios de melhor do mundo – com grande chance de conquistar o sexto em outubro
– sem que alguém supusesse isso. A virtude do português é se colocar na mais
nobre disputa do futebol, sem que se pudesse prever tal feito.
Já Messi tem outras
peculiaridades. Enquanto o jogo de Cristiano é baseado na velocidade e na
força, tornando o seu repertório previsível, os movimentos de Messi são surpreendentes.
Trata-se de um futebol mais vistoso, plástico, genial. Ou seja, o argentino é
mais talento que treino, de modo que a atuação de Messi é baseada no insight,
no improviso, e por isso é encantador vê-lo em campo. Surpreende o amante do
futebol a todo momento.
Messi abre o placar na final da Copa do Rei, em 2015, contra o Athletic Bilbao
[Vídeo: Youtube]
A dinâmica do seu jogo concatena
virtudes dos grandes jogadores da história: alta velocidade, controle da bola
muito próxima ao pé em movimentos progressivos, a ponto de cada passo (curto)
da corrida representar um toque na bola. Outro fator que potencializa a capacidade
do argentino: Messi inverte a direção da corrida com facilidade impressionante,
o que torna ainda mais difícil a tarefa de alguém abortar a sua jogada.
Como o futebol é modalidade
esportiva coletiva, seria injusto atribuir só a Messi o sucesso do seu jogo. O
melhor momento da sua carreira veio com o técnico Pep Guardiola, entre 2008 e
2012, hoje treinador do Manchester City. Na véspera de um duelo com o Real
Madri, já de noite, Guardiola ligou para Messi. O telefonema era para informar ao craque que o
Barcelona jogaria aquela partida sem centroavante, dando ao argentino a função
que ficou conhecida como “falso 9”. Nesta posição, Messi atuaria de forma
centralizada entre os volantes e os zagueiros adversários. O resto é história:
em pleno Santiago Bernabeu, o Barcelona enfiou 6x2 no Real Madri, em maio de
2009, com atuação estupenda do argentino.
Real 2x6 Barça: o jogo que mudou o patamar de Messi e estabeleceu novos parâmetros no futebol, graças a Guardiola
[Vídeo: Youtube]
Depõe contra Messi, especialmente
no atual momento, que ele dá mostras de que já atingiu o auge, e agora passa
pela trajetória descendente da carreira, ao contrário de Cristiano, que,
justamente aos 33 anos, vive o seu melhor momento. Raro no histórico dos
jogadores de futebol, uma vez que já considerada idade tardia.
O problema das comparações entre
Messi e Cristiano é que, invariavelmente, os defensores de um julgam necessário
desmerecer o outro. É a mesma mania do liberal que diminui Marx, assim como parte da
esquerda o faz com Adam Smith. O bom senso recomenda botar ambos no panteão dos
grandes pensadores, de sorte que preferir um a outro está mais ligado à identificação do que a critérios objetivos.
A discussão majoritária entre
quem ama futebol é o velho maniqueísmo de um ou outro. Como se não fosse
possível entender que ambos são brilhantes, e baita honra a nossa ter a
possibilidade de ver os dois a todo momento. Talvez quando Messi e Cristiano
encerrarem suas carreiras e a gente fizer o exercício de olhar para trás, haverá
mais requisitos à nossa disposição para um comparativo menos injusto. Ainda
assim, se a dúvida pairar e alguém entender que a minha opinião é importante,
direi aquilo que já afirmei quatro anos atrás: regozije-se a Messi.
Diante de uma obra de arte
complexa – seja ela de que natureza for –, há um benefício e um prejuízo ao
conhecê-la tardiamente: é passível de lamentação porque nos damos conta de que
algo tão bom poderia ser visto antes, mas, por outro lado, entrar em contato com
uma produção cultural já com maturidade permite apreender significados que não
seriam captados numa idade menor, sob um repertório mais limitado. Prefiro
levar o último argumento em conta para justificar o meu encontro inédito, no
último final de semana, com os sete episódios de Star Wars, como forma de me
preparar para a estreia mundial do próximo longa da série, quinta-feira, dia 14.
Logo na primeira trilogia –
episódios IV, V e VI – já é possível constatar que George Lucas concebeu uma
história à frente de seu tempo, fazendo dele uma figura genial não só com lugar
cativo na história do cinema – como roteirista, produtor e diretor –, mas
também no âmbito da literatura de ficção, como autor/escritor. Tentemos
entender por que o norte-americano é tudo isso e mais um pouco, conduzindo a
reboque a sua obra para o patamar das maiores produções cinematográficas com
registro na história. O meu relato traz percepções originais a partir dos sete
longas, sem que eu me permitisse fazer qualquer tipo de pesquisa a respeito da
história e dos filmes.
Toda a sequência é permeada,
especialmente os episódios de I a VI, por aquilo que defino como dois grandes
conceitos, cujo domínio do autor é flagrante, e que ficam evidentes em Star
Wars: Filosofia e Mitologia. O controle por parte de Lucas de diferentes
teorias e narrativas é tamanho, que não restam dúvidas de que todo esse
arcabouço é usado sem despretensão. Não há ali nada que seja involuntário, sem
querer. As recorrências que o autor faz à filosofia e à mitologia são
cirúrgicas, e isso fica transparente em uma narrativa densa, compassada e que
não confunde o espectador, embora exija deste um olhar bastante atento.
No campo da Filosofia, é possível identificar conteúdo consistente
sobre conhecimento, ética e política. A respeito da epistemologia [ou
Teoria do Conhecimento], o autor dilui ao longo da sequência cenários que se
apropriam dos quatro elementos da natureza: ar, terra, fogo e água. No vídeo abaixo, entenda que referência o autor utiliza para abordá-los, tendo ainda na Alegoria da Caverna, de Platão, uma outra ancoragem da sua narrativa:
No âmbito da ética, os guerreiros
Jedi prezam pelo dever. Para eles, é preciso ter em mente que ser um guardião da
galáxia impõe certos sacrifícios, aos quais qualquer um de nós está suscetível:
os dilemas entre aquilo que queremos e podemos, mas não devemos fazer. Estamos
aí no coração da filosofia moral de Immanuel Kant, pensador alemão do século
XVIII, fundador da corrente ética denominada deontologia: pautado pelo imperativo categórico, ou seja, agindo de
tal forma que a máxima da conduta possa se tornar lei universal, o indivíduo
pauta suas ações em princípios, ainda que o resultado delas não seja positivo.
A intenção é o fundamento da moral kantiana, em oposição ao pensamento
pragmático de Maquiavel, italiano do século XVI, cuja assertiva é “os fins
justificam os meios”, sendo permitida, neste caso, qualquer ação para
conquistar o objetivo traçado, mesmo que isso fira [física ou moralmente]
outras pessoas envolvidas. Está claro, no antagonismo complexo entre pai
[Anakin] e filho [Luke], quem adere a uma e à outra corrente.
Por fim, acompanhe no vídeo a seguir uma análise sobre como o cineasta transita pelos conceitos da teoria política:
Saindo da filosofia, Lucas se
ancora muito na mitologia de origem grega. A oposição entre caos e ordem é
presente o tempo todo nos sete episódios. Impossível não mencionar a explicação
que a mitologia grega dá à origem do universo. No princípio de tudo, era o
caos, representado pelos Titãs, uma vez que as divindades na tradição grega são
imanentes e múltiplas [politeísmo], e não transcendente e única [monoteísmo] como no judaico-cristianismo e no Islamismo. Os deuses Titãs
rivalizaram com os Olimpianos, aqueles que pretendiam estabelecer - e foram bem sucedidos - a ordem no
cosmos.
Nessa esteira, é imperativo
recorrer a outro elemento da mitologia grega: os conflitos entre pai e filho,
sempre muito presentes na literatura e na história do período clássico. O líder
dos Titãs era um deus chamado Cronos [tempo], que rivalizou com seu pai, Urano
[céu], um dos primeiros deuses a existir, juntamente com Gaia [terra] e Caos
[queda]. Cronos, ao pressupor que teria o mesmo fim de seu pai, tratou de se
resguardar, enquanto pôde, da ameaça dos próprios filhos, destino que foi
selado no confronto com o mais novo deles, Zeus. Outro exemplo se encontra na
história escrita por Sófocles: Édipo, ao nascer, teve a própria vida
encomendada pelo pai, Laio. Não sendo bem-sucedido o assassinato, anos depois
ambos, sem saber das identidades de um e outro, se encontram, e o fim é o mesmo:
o pai é morto pelo filho. Outros dois episódios, esses comprovadamente verídicos
e mais conhecidos pelo senso comum, podem se encaixar nesta reflexão: Alexandre
Magno, durante muito tempo, foi considerado mandante da conspiração que matou
seu pai, Filipe II, rei da Macedônia, nação que já dominava a Grécia. A seguir,
conhecemos a história do imperador romano Marcus Aurélio, morto pelo filho
Commodus. A narrativa de Star Wars não poupa elementos dessa natureza, seja com
Anakin e Luke, seja com Han e Ben, cujo desfecho é a morte dos pais pelos
próprios filhos. Mais mitologia grega que isso, impossível.
Ainda no campo mitológico, Star
Wars é carregado de elementos bíblicos: [1] O fruto proibido, o amor que não
poderia se consumar pela possibilidade de desencadear desgraças (Anakin e
Amidala são a metáfora do casal que protagonizou o pecado original, Adão e
Eva); [2] Bem x Mal; [3] Luz x Trevas; [4] a ideia de alguém “escolhido” [referência
ao Messias], pobre, em meio à escravidão e sem pai [é o caso de Anakin e, por que não, de Moisés e do próprio nazareno], em
quem todo um povo deposita a esperança de libertá-lo da opressão [menção a hebreus/judeus];
[5] a separação da mãe para cumprir o seu destino, tendo a possibilidade de
escolhê-lo ou recusá-lo [é muito Jesus pro meu gosto!]; [6] uma tal Ordem 66,
já na transição da República para o Império, numa citação ao número da Besta
[666]. Com evidência, são elementos que caracterizam a sequência. Porém, há um
que, logo de cara, dá uma chave importante para desvendar os enigmas da obra: o
nome Skywalker. Numa tradução sem muito rigor, poderíamos encontrar anjo. O primeiro nome do protagonista da
saga é Luke, uma abreviação ou
apelido para Lucas, proveniente do
termo latim Lux, ou seja, Luz. Agora ficou fácil: Luke Skywalker é
o Anjo de Luz, enquanto que o pai, Anakin Skywalker, é também anjo, mas aquele
que cai, que se entrega ao medo, ódio e à arrogância. Lembrou Lúcifer, anjo
que se rendeu às tentações do mal porque tinha a pretensão de ser maior do que
Deus. Cristo foi tentado no mesmo sentido, mas não sucumbiu. Até o momento,
Luke é um cristão inveterado.
Dois anjos se enfrentam: o filho, Luke [à direita], que se manteve fiel ao ensinamento Jedi, e o pai, Anakin, anjo decaído já sob as feições de Darth Vader [Foto: www.reddit.com]
A obra de George Lucas contém
toda essa gama de teorias, conceitos, nomenclaturas que a torna especial. Nesse
aspecto, o último episódio [O despertar da força, 2015] destoou negativamente dos
seis anteriores, pois se propôs mais ao entretenimento. Com raras exceções –
como no discurso político de ódio, no trabalho com diferentes elementos da
natureza e no confronto entre pai e filho –, o último filme da sequência não
resgatou a essência complexa e rica idealizada por Lucas. Algo a se lamentar,
já que o escritor, roteirista e diretor criou, na combinação de elementos
díspares já existentes, uma mitologia à parte, assim como fizeram J. R. R.
Tolkien [O Senhor dos Anéis], J. K. Rowling [Harry Potter] e George R. R.
Martin [Game of Thrones]. Dos quatro aspectos essenciais a uma narrativa [tempo,
espaço, personagens e conflito], os três primeiros são originais, exclusivos da
saga. Ainda assim, não abriu mão do receituário que sempre dá certo: recheou a
história com romance, humor, perseguições, corridas, lutas, tiros, mortes. Não tinha
como dar errado.
Alguém poderá se perguntar: se eu
não detiver os conhecimentos sobre filosofia e mitologia apresentados aqui, não
entenderei o filme? Entenderá, mas sob outra perspectiva. Do mesmo modo que uma
pessoa, detentora de informações que vão além das minhas, apreenderá um
significado mais completo e fiel da obra. Na pior das hipóteses, a saga poderá
se resumir ao seu próprio título, em que seres humanos, monstrengos e robôs se
confrontam para manter o caos ou estabelecer a paz. Não importa. Já terá valido
a pena.
“[...] mas o tempo é um
tecido invisível em que se pode bordar tudo, uma flor, um pássaro, uma dama, um
castelo, um túmulo. Também se pode bordar nada. Nada em cima de invisível é a
mais sutil obra deste mundo, e acaso do outro” [Machado de Assis, em Esaú e Jacó]
Parece ser consenso entre
religiões e doutrinas que negam a religação
que a morte é inexorável e representa o fim de um ciclo, seja ele concebido
por preceitos divinos ou resultado de embates cósmicos que nos fazem ser apenas
uma fração insignificante do universo, desprovido de qualquer protagonismo que
o ser humano teima em homologar a si próprio. E ainda que a gente se escore na
vida eterna, em outras vidas finitas ou na inexistência de Deus e diabo, o fato
é que a morte é implacável com quem vai e tem o talento inigualável de machucar
quem fica.
E o medo da perda acaba fazendo
da gente o esboço do egoísmo. É comum, à beira do suspiro derradeiro de quem
acena um “tchau”, o apego à carne, à pequenez da nossa ontologia que só
consegue entender uma fagulha do todo. O todo nos escapa, tamanha a
nossa insignificância. Talvez não seja a perda em si, mas a incapacidade de
entender o que se passa, o nosso maior monstro, o fantasma que nos coloca de
joelhos a decifrar, sem sucesso, o maior enigma que está posto. A gente se
habituou a manipular o mundo, a impor a nossa soberania sobre as gentes e as
coisas, e quando se depara com a única equação da qual não tem controle, sofre.
A saudade nos traz uma certeza,
que é pessimista por excelência: na ausência de quem foi, nada será como antes.
É inegável: cada pessoa, na complexidade que é a existência humana, é
insubstituível. Por mais que se empenhem, dos que nos acompanham em meio à tormenta só ficará o esforço de consolar, um afago em gesto ou palavra. Em suma, a falta de alguém
importante remexe as nossas entranhas, cria-nos vácuos no peito, flashes de
lembranças, uma lágrima a arranhar a face... Acabou.
Mas se a saudade só vivesse de
infortúnios, ninguém resistiria a uma ausência acachapante. Ela ajuda a amadurecer
o espírito, coage a mente a entender que a vida, o tempo todo, também é de
perdas. O corpo responde com o pranto e a sensação de que o tempo estacionou,
no intuito de aborrecer ainda mais o nosso juízo. Mas ele – o tempo – passa, e
a não aceitação dá lugar ao conformismo de que, a partir dali, será assim. Então,
o exercício de revisitar a pessoa, num movimento mental de ver quem partiu sob
uma outra perspectiva, torna-se praxe. Passamos a pinçar detalhes da história e
a ressignificá-los.
[Fonte: www.casamento.culturamix.com]
E essa ação atrasada se dá por um
equívoco de cálculo: é consenso entre nós que sempre haverá uma chance de
entender o gesto de alguém em vida, sem perceber que acabamos por eternizar o
“deixa pra depois”. É só quando não há mais depois
que buscamos o aceno, o beijo, o semblante, o sorriso, a palavra, o olhar, uma
foto, um cheiro, um lugar. Enfim, qualquer coisa que na displicência da vida
não atentamos e que, agora, tem significados que confortam, por um lado, mas
por outro frustram em função da impossibilidade de agradecer, não poder mostrar que nada foi em
vão.
Hoje, exatamente um ano após a
maior perda que tive, não é dia diferente na saudade. Porque não houve um
momento, nesses 365 dias, que eu não tenha revisitado aquela que mais zelou por mim, a ela virado
do avesso e a mim também. Mas a falta é maior. O ser humano cometeu o erro de
encapsular o tempo, torná-lo contábil, e nesse movimento de controlar a
realidade, esqueceu-se das simbologias que o titã Cronos poderia criar. Porém, propõe
Machado, “este desejo de capturar o tempo é uma necessidade da alma e dos
queixos; mas ao tempo dá Deus habeas
corpus”.
Por isso, há que ser otimista
também: se alguém não tivesse botado areia na ampulheta, as datas simbólicas
não concentrariam as angústias da perda. Sem demarcação temporal, a vida seria
uma sucessão constante de lamentações, um “eterno retorno” às avessas do
proposto por Nietzsche. No fim das contas, a dor de hoje é a dor de sempre, e
assim será até o dia em que eu me tornar a saudade de alguém.
Eu já li quatro obras de
Shakespeare: Romeu e Julieta, a mais
fraca delas; O Rei Lear; Otelo; e aquela que, junto com Memórias Póstumas de Brás Cubas, de
Machado de Assis, é a maior que a literatura de ficção já produziu, Hamlet. Até tenho um quinto livro do
escritor inglês nascido no século XVI, mas só acessei o conteúdo por meio do
filme. Por duas vezes – a primeira no cinema e ontem (18) pela TV – assisti
a Macbeth: ambição e guerra (2015), dirigido
por Justin Kurzel, cujas atuações destacáveis ficam a cargo de Michael Fassbender e
Marion Cotillard.
O enredo traz aspectos
importantes da bibliografia shakespeariana, em sua faceta trágica: conspiração, culpa, traição e morte.
Macbeth (Fassbender) é general do exército escocês. Influenciado pela esposa,
Lady Macbeth (Cotillard), personagem forte, densa e igualmente assombrada pela morte precoce do filho, assassina o rei. Único a testemunhar o crime, Malcolm (Jack Reynor), o herdeiro do trono, é forçado a fugir. Macbeth e sua cúmplice, agora, são os únicos a ter ciência completa dos fatos. A condição de monarca cai no colo do conspirador do reino.
[Fonte: www.wicaonline.org]
A partir daí, a sensação de
culpa, nos moldes de Crime e Castigo,
de Dostoiévski, toma conta de Macbeth, que, justamente por isso, surta. A
fragilidade do agora rei fica escancarada na sua incapacidade de lidar com as
traições e mortes das quais fora autor ou mandante. A esposa, vendo a fraqueza
do marido se transformar em tirania, tira a própria vida, talvez por perceber que
despertou em Macbeth o lado mais obscuro da vida: o receio de acontecer consigo
aquilo que ele causou aos outros.
Há que se destacar alguns pontos
da produção cinematográfica: a atuação do casal protagonista é brilhante. A
expressividade dos gestos, o texto bem fiel à redação de Shakespeare e a carga
dramática, com pertinência, que Cotillard e Fassbender deram aos seus
personagens, quase que compondo uma peça de teatro filmada, mostram que o filme
não se preocupou em popularizar a obra literária. A ambientação e a fotografia
dão uma carga ainda mais pesada à narrativa. Do contrário, talvez surgiria um
conteúdo mais acessível ao público, porém infiel à obra canônica.
Deixando de lado as sempre
injustas comparações entre livro e filme, Macbeth:
ambição e guerra contém 105 minutos de entretenimento consistente e
desafiador. Mas não é necessário se limitar à ficção. É quase inevitável não
buscar paralelo com a nossa realidade política em curso. Se a história é sofisticada
e o texto de difícil entendimento, não será trabalhoso ao espectador
identificar que a tragédia brasileira tem o seu Macbeth.
O vento que soprava na varanda arejou o ar abafado de janeiro e pôs a balançar o candeeiro que alumiava em movimento o lado de fora da casa. Quando uma rajada se engrandeceu, o fogo apagou, e o brilho da luz que outrora contemplava uma conversa não presenciou o beijo apaixonado de duas mulheres que ali estavam há algum tempo. Elas não se amavam, nunca haviam se visto até então. Se contentaram com a nudez em meio à sombra por entenderem que o prazer dispensa protocolos.
RECOMEÇO
Vinha de longe, cambaleando, um pedaço miúdo de gente. As pernas – fofas, arqueadas e diminutas deveras – zanzavam, com os pés a tatearem o chão sem firmeza. Parou, fez-se do corpo um pêndulo e caiu. Não chorou. Com sabedoria inata, supunha que a vida era de tombos também, e preferiu se agarrar a um objeto qualquer para se colocar de pé e começar tudo outra vez.
PARAÍSO
Havia algo de fascinante no céu daquela noite: a lua, encoberta por espessas nuvens, não deixava a escuridão tomar conta de tudo. Em derredor, relâmpagos relatavam a chuva recente ou anunciavam uma outra vindoura e que, agora, caía forte nas imediações. Ali, numa rua pouco habitada e quase sem movimento, restou ao casal uma brisa boa, daquelas que encorajam transgressões e perturbam os bons modos. E entre um gole e outro de cerveja, dois corpos desavergonhados e em enlace.
MISTÉRIO
De tanto pensar no sentido da vida, morreu. E sem poder falar o que descobrira – pois morto já estava –, guardou segredo e legou a quem ficou a angústia de viver sem saber ao certo por quê.
FÉ
A vida lhe havia dado mais uma pancada. Caído e imerso numa fragilidade soturna, não sorriu, nem chorou. Sabia que o momento era de coragem, com parcimônia. E antes de se levantar e prosseguir, alinhou os joelhos no chão, cerrou os olhos e, abrindo os braços com as palmas pra cima, bradou em silêncio: “meu Deus!”.
[Fonte: www.observenigeria.com]
IGNORÂNCIA
O professor, convicto de que estava ali só para ensinar, perdeu oportunidade de aprender com os alunos, que aprendiam e ensinavam todos os dias que ensino e aprendizagem não são monopólios de quem quer que seja.
AUSÊNCIA
Acordou feliz do sonho que acabara de ter. De imediato, amuou-se: a pessoa só lhe era presente nas brevidades do sono. Lembrou, então, que a vida não brinca de sonhar e que o sonho, irrealizável, caíra-lhe como um lembrete: contenta-te com a saudade.
DILEMA
Com receio de sofrer por amor, preferiu não amar. E como não amou e nem sofreu, deixou de provar o gosto doce de amar e ser mais feliz do que foi sem sofrer.
AMPULHETA
Quando se deu conta, a vida lhe passara. Enquanto via as feridas do passado cicatrizarem, outras se abriam em virtude do futuro não vivido. E concluiu resignadamente: o tempo é o melhor e o pior dos remédios.
AVESSO
Ao avistar algo estranho, parou. Estava diante de uma situação que jamais vivera. E quando menos esperava, o amor passou por ela como um mar em ressaca que arrasta tudo sem gentilezas. Ao recuo das águas, a calmaria fazia-lhe a emanação de uma outra vida, arrebatada pelo sentimento do qual ela não mais queria abrir mão.