Não votei em Lula em 2002, primeira eleição presidencial da
qual fui eleitor, com 18 anos. Também não o escolhi em 2006. Na última, não
optei por Dilma. Digo isto para não me acusarem de ser petista, pois deixarei
claro ao longo e no fim deste texto não o meu partidarismo, mas simpatia em
relação ao modo como o PT gere o país há quase 12 anos. Longe também de julgar
o modelo perfeito, mas, convenhamos, o Brasil nunca viveu um momento tão bom em
sua história como este que se iniciou em 2003. Vejamos por quê.
Na economia, por exemplo. É verdade que FHC, ainda na gestão
de Itamar Franco [é impressionante como muita gente alija o mineiro desse
processo de avanço do país], botou o Brasil nos trilhos. Com o Plano Real, a
economia estabilizou-se e deixou de ter os índices diários de inflação das gestões de Sarney e Collor. Mas
quem fez a locomotiva funcionar foi Lula. Com ele, o país manteve a inflação
controlada e com um detalhe de extrema relevância: muita gente está consumindo.
O país está movimentando dinheiro, e é muito mais complicado controlar a
inflação nesse cenário. No período de FHC só uma pequena classe comprava. Os
méritos de Lula – e Dilma manteve isso – são inegáveis nesse aspecto. O que a
presidente precisa retomar é um crescimento mais significativo da nossa
economia, o que seu antecessor soube fazer bem, e também trazer a inflação
de volta ao centro da meta (3,5% ao ano).
No campo do emprego, algo que mantém relação direta com a
economia, o PT triunfou. As cifras de desemprego são mantidas na faixa dos 6%,
um número com o qual o Brasil jamais sonhou. Atrelado a isso, temos o aumento
do salário mínimo que, a cada ano, valoriza mais, dando ao brasileiro –
especialmente ao mais simples – um poder maior de compra, embora ainda abaixo
do piso de outros países, como na Argentina, cujo mínimo é de R$ 1.169,00 (Ver
mais em http://exame.abril.com.br/economia/noticias/valorizacao-do-salario-minimo-nao-resultou-em-desemprego?page=1
e http://exame.abril.com.br/economia/noticias/os-10-paises-com-os-maiores-salarios-minimos#12).
Outro avanço dos últimos 12 anos foi na educação. Eu não
seria irresponsável de mencionar uma melhoria significativa no ensino público básico.
É verdade que os índices de analfabetismo caíram, mas a incompreensão de um
texto mínimo ainda é gritante, ao que chamamos de analfabetismo funcional. Outro ponto importante nessa questão: ensinos fundamental e médio, quando não são
particulares, estão sob responsabilidade de Estados e municípios, e não do
governo federal. Este define as Leis de Diretrizes e Bases e realiza os
repasses, mas a operação cabe às cidades ou aos Estados. É do governador ou do prefeito que devemos exigir melhores condições de trabalho e estudo nos dois primeiros graus da nossa educação.
É mais que urgente atribuir a culpa aos responsáveis certos,
talento que o brasileiro, nessa onda de pessimismo e terrorismo midiático, não
tem praticado. O único nível da educação que é de responsabilidade
direta do governo federal é o terceiro grau. Cá pra nós: o acesso às
universidades e aos institutos públicos federais, antes sucateados e restritos
a poucas pessoas, foi expandido. A infraestrutura melhorou, embora longe de ser
a ideal; as cotas foram ampliadas, trazendo mais justiça étnica e social às
universidades; o novo ENEM e a adesão das instituições federais são importantes na composição desse novo contexto; além dos programas de incentivos, como Prouni e FIES, existentes
nas instituições particulares. Enfim, pessoas que só sonhavam com um curso
superior, hoje têm a possibilidade do diploma, de uma profissão, de uma vida
melhor.
Não há mal nisso. Não há problemas em ver pessoas migrando
de níveis sócio-econômicos, comprando ar condicionado, instalando TV por
assinatura, tirando o primeiro carro zero, saindo do aluguel para financiar a
sua casa própria, fazendo viagens com a família, frequentando aeroportos,
comprando celulares – justiça seja feita, esta uma conquista viabilizada por
FHC quando privatizou as telecomunicações - só pra constar, fazer o mesmo com a Vale do Rio Doce foi um crime imperdoável. O
que não dá para entender é ver a velha classe média, mais até do que as elites,
torcendo o nariz para isso. Porque essa mesma classe média também melhorou
de vida nos últimos 12 anos: quem tinha dois automóveis, hoje tem mais e
melhores; quem tinha uma casa própria, hoje vive de aluguel; faz viagens mais
longas, compra muito mais que d’antes. Mas, incompreensivelmente, não aceita
que os emergentes passem a consumir os mesmos produtos e entretenimentos que
ela, por simples vaidade e mesquinharia. Não que a vida dos mais abonados tenha
piorado nos último 12 anos. Ao contrário. O problema é que eles não querem que
a arraia miúda viva melhor. Qual o
problema de termos mais gente prosperando?
Nesse sentido, o PT foi capaz de fazer aquilo que o PSDB
luta para manter distante: igualdade social. Lula expandiu e criou projetos
sociais. O Bolsa Família, que as elites e classes medianas antigas dizem ser
esmola e programa de compra de votos, faz o que é responsabilidade de um
governo que se preocupa com os mais pobres: dá expectativas melhores aos
excluídos. Porque é fácil falar
aberrações sobre programas sociais quando se têm todas as refeições do dia à
mesa, quando a vida, por sorte e muito trabalho, foi benéfica a si. A
maioria, a ampla maioria dos que recebem o auxílio, são pessoas dedicadas,
que por motivos diversos não conseguiram deslanchar. À medida que conseguem
isso – e os programas assistencialistas são fundamentais nesse processo –, os
beneficiados vão abrindo mão do que recebem do governo. (Para saber mais sobre
o assunto, acessar http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2014/01/familias-melhoram-de-vida-e-abrem-mao-do-bolsa-familia-no-interior-do-pi.html,
http://www.revistaforum.com.br/blog/2013/05/169-milhao-de-familias-abrem-mao-do-bolsa-familia/
e http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2013/10/13/interna_politica,393094/quase-2-milhoes-de-familias-aumentaram-renda-e-abriram-mao-do-bolsa-familia.shtml).
Com tudo isso, estranhamente, o que tem marcado a cobertura
da grande mídia [Globo, Folha e Veja] nesse período eleitoral é o pessimismo
atrelado a uma corrente contrária ao PT. E a velha classe média, que é grande e
consome todas essas mídias, compra a ideia. Pra situarmos melhor
essa tal classe média tradicional, é ela que habita aos montes as redes
sociais, especialmente o Facebook, divulgando opiniões contrárias ao PT e a
Dilma, na maioria das vezes infundadas. Não há uma oposição em massa ao PT por
convicção. O que há é uma corrente desordenada, que julga a Petrobrás ser um
total fracasso por causa da compra da usina de Passadena. Vamos com calma... É
verdade que não queremos que o país faça maus negócios, mas o mercado é
dinâmico, muda a todo momento. O mesmo pode acontecer com qualquer um de nós:
podemos comprar uma casa por um preço elevado hoje e, amanhã, ocorrer uma crise
no setor imobiliário que fará com que os preços caiam. No fim, você terá
cometido um péssimo negócio, mas não por má fé. Simplesmente o mercado o traiu.
Com a Petrobrás, até que se prove o contrário, ocorreu o mesmo. É bom que se
diga: a Petrobrás deixou de ser uma empresa de fundo de quintal, sucateada pela
gestão FHC, para se tornar uma potência no campo da produção de energia. A
propósito, a descoberta e exploração do pré-sal não deixam muita dúvida sobre
isso.
Curiosamente, o
fracasso de Alckmin, em São Paulo, no que tange à distribuição de água, aos
escândalos envolvendo o PSDB na questão do metrô e aos problemas na maior universidade do país, a USP, não ganhou a mesma postura da mídia, nem da classe média mais reacionária
do Brasil: os paulistas preferem resignar-se e culpar a escassez de chuvas pela deficiência no fornecimento de água. Alckmin demite funcionários do metrô, que exercem o seu direito à
greve? Palmas pro governador! A Universidade de São Paulo vai mal das pernas? Privatização na USP! Alckmin já teve três mandatos como chefe maior do
Estado mais rico e importante do Brasil, sendo dois deles por meio de eleições. Tem
grandes chances de conquistar mais um quadriênio. E é impressionante como São
Paulo não enxerga que Geraldo é a própria materialização do fracasso.
O defeito mais estrondoso do PT é fazer uma política de
coalizão ampla, abraçando inúmeros partidos que, em essência, possuem
ideologias e origens completamente opostas às do Partido dos Trabalhadores. Aliar-se a muita gente é o ovo da serpente
da corrupção. A reforma política clama por uma alteração nessas alianças,
sujas na maior parte das vezes. Com o PSDB de Fernando Henrique foi assim. Com
o PT de Lula e Dilma, do mesmo modo. Os
mensalões dos dois partidos foram resultado de uma coalizão quilométrica e da
utilização da política como um grande negócio. O PT não é mais corrupto que os demais partidos. O PSDB está longe de pairar sobre o bem e o mal. Cabe a nós, eleitores e cidadãos, o questionamento às corrupções de todos os lados.
Nesse sentido, é bom que lembremos: os corruptos do PT estão
na cadeia. Integrantes do mais alto escalão do partido que governa o país há
quase 12 anos foram julgados e condenados por crimes que cometeram. Com os
tucanos, não aconteceu isso, e não vejo clamores para que o mesmo ocorra. Sobre
o caso específico de José Dirceu, membro importante do PT, ele foi julgado e condenado
sem provas, embora você possa achar – assim como eu acho – que ele e Lula encabeçaram
o esquema todo. Mas nesses assuntos de Justiça não há achismos. Há o que se
prova, e a prisão de Dirceu foi autoritária, avalizada por Joaquim Barbosa, o
ex-ministro que o Brasil aprendeu a amar sem o menor senso crítico.
No que tange à Copa, assunto em voga no Brasil até pouco
tempo, é importante ter prudência antes de jogar todos os atrasos das obras na
conta da presidente. O VLT em Cuiabá e Fortaleza não ficaram prontos? Conteste o
governo do Estado. A culpa do PT nessa história de mundial foi ter feito
política no momento de definir as sedes. Foi um exagero escolher 12. Com oito,
faríamos uma ótima Copa. Seriam quatro dores de cabeça a menos. Mas Lula quis
agradar os aliados. Voltamos ao problema da extensa coalizão, germe das
corrupções mais gigantescas.
Outro pecado do atual governo em relação à Copa foi a
aceitação quase que integral das exigências da FIFA. Quem teve acesso à Lei
Geral da Copa percebeu que a entidade organizadora do mundial (é sempre bom
lembrar, a FIFA não é dona do futebol, que está muito acima dela. A entidade só
promove eventos) subverteu leis nacionais em prol de seus interesses. De todas
as aberrações, a mais lamentável foram as remoções. Famílias inteiras, que tinham suas casas há
anos em determinadas comunidades, foram forçadas a abandonarem seus lares para
que as obras dos megaeventos (Copa e Olimpíadas) pudessem botar abaixo o que
eles julgam velho e impertinente. Além do pouco diálogo e da truculência
policial, vimos materializar o pior tipo de violência: aquela cometida pelo
Estado contra o seu próprio povo. Fora os desvios de verba e os atrasos em
obras importantes, eis a nossa vergonha maior por ter sediado este mundial. A
“Copa das Copas” não foi a nossa. Foi a da Alemanha, em 2006.
Não sei se votarei em Dilma nas eleições de outubro. A
certeza que tenho é a de que o país avançou, e a vitória de Aécio representaria
o retrocesso de todas as conquistas, principalmente na área social. Marina fez
uma campanha e tanto em 2010, apareceu como uma alternativa de destaque, mas tem
metido os pés pelas mãos, também no intuito de agradar geral. Aí começa a
passar por cima das próprias convicções. E alguém sem convicção, ainda mais um
político, é alguém nulo, sem cara.
Nunca fui aquele patriota pachecão, que defende o Brasil só
por ser brasileiro. Sempre procurei olhar o país por um viés crítico,
entendendo que assim é a melhor forma de melhorar o lugar em que vivo. E o local onde nasci e pretendo morrer tem
melhorado, o que não significa que não possa avançar ainda mais, seja com o PT
ou com um partido que tenha isso como propósito. Nesse sentido, a função
dos políticos é gerir com zelo os bens públicos. A nossa obrigação é
politizar-nos, fazer as escolhas corretas e cobrar esse ou aquele representante
de maneira devida.