terça-feira, 9 de setembro de 2014

POR QUE EU NÃO SOU UM PESSIMISTA

Não votei em Lula em 2002, primeira eleição presidencial da qual fui eleitor, com 18 anos. Também não o escolhi em 2006. Na última, não optei por Dilma. Digo isto para não me acusarem de ser petista, pois deixarei claro ao longo e no fim deste texto não o meu partidarismo, mas simpatia em relação ao modo como o PT gere o país há quase 12 anos. Longe também de julgar o modelo perfeito, mas, convenhamos, o Brasil nunca viveu um momento tão bom em sua história como este que se iniciou em 2003. Vejamos por quê.

Na economia, por exemplo. É verdade que FHC, ainda na gestão de Itamar Franco [é impressionante como muita gente alija o mineiro desse processo de avanço do país], botou o Brasil nos trilhos. Com o Plano Real, a economia estabilizou-se e deixou de ter os índices diários de inflação das gestões de Sarney e Collor. Mas quem fez a locomotiva funcionar foi Lula. Com ele, o país manteve a inflação controlada e com um detalhe de extrema relevância: muita gente está consumindo. O país está movimentando dinheiro, e é muito mais complicado controlar a inflação nesse cenário. No período de FHC só uma pequena classe comprava. Os méritos de Lula – e Dilma manteve isso – são inegáveis nesse aspecto. O que a presidente precisa retomar é um crescimento mais significativo da nossa economia, o que seu antecessor soube fazer bem, e também trazer a inflação de volta ao centro da meta (3,5% ao ano).


No campo do emprego, algo que mantém relação direta com a economia, o PT triunfou. As cifras de desemprego são mantidas na faixa dos 6%, um número com o qual o Brasil jamais sonhou. Atrelado a isso, temos o aumento do salário mínimo que, a cada ano, valoriza mais, dando ao brasileiro – especialmente ao mais simples – um poder maior de compra, embora ainda abaixo do piso de outros países, como na Argentina, cujo mínimo é de R$ 1.169,00 (Ver mais em http://exame.abril.com.br/economia/noticias/valorizacao-do-salario-minimo-nao-resultou-em-desemprego?page=1 e http://exame.abril.com.br/economia/noticias/os-10-paises-com-os-maiores-salarios-minimos#12).


Outro avanço dos últimos 12 anos foi na educação. Eu não seria irresponsável de mencionar uma melhoria significativa no ensino público básico. É verdade que os índices de analfabetismo caíram, mas a incompreensão de um texto mínimo ainda é gritante, ao que chamamos de analfabetismo funcional. Outro ponto importante nessa questão: ensinos fundamental e médio, quando não são particulares, estão sob responsabilidade de Estados e municípios, e não do governo federal. Este define as Leis de Diretrizes e Bases e realiza os repasses, mas a operação cabe às cidades ou aos Estados. É do governador ou do prefeito que devemos exigir melhores condições de trabalho e estudo nos dois primeiros graus da nossa educação.

É mais que urgente atribuir a culpa aos responsáveis certos, talento que o brasileiro, nessa onda de pessimismo e terrorismo midiático, não tem praticado. O único nível da educação que é de responsabilidade direta do governo federal é o terceiro grau. Cá pra nós: o acesso às universidades e aos institutos públicos federais, antes sucateados e restritos a poucas pessoas, foi expandido. A infraestrutura melhorou, embora longe de ser a ideal; as cotas foram ampliadas, trazendo mais justiça étnica e social às universidades; o novo ENEM e a adesão das instituições federais são importantes na composição desse novo contexto; além dos programas de incentivos, como Prouni e FIES, existentes nas instituições particulares. Enfim, pessoas que só sonhavam com um curso superior, hoje têm a possibilidade do diploma, de uma profissão, de uma vida melhor.


Não há mal nisso. Não há problemas em ver pessoas migrando de níveis sócio-econômicos, comprando ar condicionado, instalando TV por assinatura, tirando o primeiro carro zero, saindo do aluguel para financiar a sua casa própria, fazendo viagens com a família, frequentando aeroportos, comprando celulares – justiça seja feita, esta uma conquista viabilizada por FHC quando privatizou as telecomunicações - só pra constar, fazer o mesmo com a Vale do Rio Doce foi um crime imperdoável. O que não dá para entender é ver a velha classe média, mais até do que as elites, torcendo o nariz para isso. Porque essa mesma classe média também melhorou de vida nos últimos 12 anos: quem tinha dois automóveis, hoje tem mais e melhores; quem tinha uma casa própria, hoje vive de aluguel; faz viagens mais longas, compra muito mais que d’antes. Mas, incompreensivelmente, não aceita que os emergentes passem a consumir os mesmos produtos e entretenimentos que ela, por simples vaidade e mesquinharia. Não que a vida dos mais abonados tenha piorado nos último 12 anos. Ao contrário. O problema é que eles não querem que a arraia miúda viva melhor. Qual o problema de termos mais gente prosperando?

Nesse sentido, o PT foi capaz de fazer aquilo que o PSDB luta para manter distante: igualdade social. Lula expandiu e criou projetos sociais. O Bolsa Família, que as elites e classes medianas antigas dizem ser esmola e programa de compra de votos, faz o que é responsabilidade de um governo que se preocupa com os mais pobres: dá expectativas melhores aos excluídos. Porque é fácil falar aberrações sobre programas sociais quando se têm todas as refeições do dia à mesa, quando a vida, por sorte e muito trabalho, foi benéfica a si. A maioria, a ampla maioria dos que recebem o auxílio, são pessoas dedicadas, que por motivos diversos não conseguiram deslanchar. À medida que conseguem isso – e os programas assistencialistas são fundamentais nesse processo –, os beneficiados vão abrindo mão do que recebem do governo. (Para saber mais sobre o assunto, acessar http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2014/01/familias-melhoram-de-vida-e-abrem-mao-do-bolsa-familia-no-interior-do-pi.html, http://www.revistaforum.com.br/blog/2013/05/169-milhao-de-familias-abrem-mao-do-bolsa-familia/ e http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2013/10/13/interna_politica,393094/quase-2-milhoes-de-familias-aumentaram-renda-e-abriram-mao-do-bolsa-familia.shtml).

Com tudo isso, estranhamente, o que tem marcado a cobertura da grande mídia [Globo, Folha e Veja] nesse período eleitoral é o pessimismo atrelado a uma corrente contrária ao PT. E a velha classe média, que é grande e consome todas essas mídias, compra a ideia. Pra situarmos melhor essa tal classe média tradicional, é ela que habita aos montes as redes sociais, especialmente o Facebook, divulgando opiniões contrárias ao PT e a Dilma, na maioria das vezes infundadas. Não há uma oposição em massa ao PT por convicção. O que há é uma corrente desordenada, que julga a Petrobrás ser um total fracasso por causa da compra da usina de Passadena. Vamos com calma... É verdade que não queremos que o país faça maus negócios, mas o mercado é dinâmico, muda a todo momento. O mesmo pode acontecer com qualquer um de nós: podemos comprar uma casa por um preço elevado hoje e, amanhã, ocorrer uma crise no setor imobiliário que fará com que os preços caiam. No fim, você terá cometido um péssimo negócio, mas não por má fé. Simplesmente o mercado o traiu. Com a Petrobrás, até que se prove o contrário, ocorreu o mesmo. É bom que se diga: a Petrobrás deixou de ser uma empresa de fundo de quintal, sucateada pela gestão FHC, para se tornar uma potência no campo da produção de energia. A propósito, a descoberta e exploração do pré-sal não deixam muita dúvida sobre isso.

Curiosamente, o fracasso de Alckmin, em São Paulo, no que tange à distribuição de água, aos escândalos envolvendo o PSDB na questão do metrô e aos problemas na maior universidade do país, a USP, não ganhou a mesma postura da mídia, nem da classe média mais reacionária do Brasil: os paulistas preferem resignar-se e culpar a escassez de chuvas pela deficiência no fornecimento de água. Alckmin demite funcionários do metrô, que exercem o seu direito à greve? Palmas pro governador! A Universidade de São Paulo vai mal das pernas? Privatização na USP! Alckmin já teve três mandatos como chefe maior do Estado mais rico e importante do Brasil, sendo dois deles por meio de eleições. Tem grandes chances de conquistar mais um quadriênio. E é impressionante como São Paulo não enxerga que Geraldo é a própria materialização do fracasso.

O defeito mais estrondoso do PT é fazer uma política de coalizão ampla, abraçando inúmeros partidos que, em essência, possuem ideologias e origens completamente opostas às do Partido dos Trabalhadores. Aliar-se a muita gente é o ovo da serpente da corrupção. A reforma política clama por uma alteração nessas alianças, sujas na maior parte das vezes. Com o PSDB de Fernando Henrique foi assim. Com o PT de Lula e Dilma, do mesmo modo. Os mensalões dos dois partidos foram resultado de uma coalizão quilométrica e da utilização da política como um grande negócio. O PT não é mais corrupto que os demais partidos. O PSDB está longe de pairar sobre o bem e o mal. Cabe a nós, eleitores e cidadãos, o questionamento às corrupções de todos os lados.

Nesse sentido, é bom que lembremos: os corruptos do PT estão na cadeia. Integrantes do mais alto escalão do partido que governa o país há quase 12 anos foram julgados e condenados por crimes que cometeram. Com os tucanos, não aconteceu isso, e não vejo clamores para que o mesmo ocorra. Sobre o caso específico de José Dirceu, membro importante do PT, ele foi julgado e condenado sem provas, embora você possa achar – assim como eu acho – que ele e Lula encabeçaram o esquema todo. Mas nesses assuntos de Justiça não há achismos. Há o que se prova, e a prisão de Dirceu foi autoritária, avalizada por Joaquim Barbosa, o ex-ministro que o Brasil aprendeu a amar sem o menor senso crítico.

No que tange à Copa, assunto em voga no Brasil até pouco tempo, é importante ter prudência antes de jogar todos os atrasos das obras na conta da presidente. O VLT em Cuiabá e Fortaleza não ficaram prontos? Conteste o governo do Estado. A culpa do PT nessa história de mundial foi ter feito política no momento de definir as sedes. Foi um exagero escolher 12. Com oito, faríamos uma ótima Copa. Seriam quatro dores de cabeça a menos. Mas Lula quis agradar os aliados. Voltamos ao problema da extensa coalizão, germe das corrupções mais gigantescas.


Outro pecado do atual governo em relação à Copa foi a aceitação quase que integral das exigências da FIFA. Quem teve acesso à Lei Geral da Copa percebeu que a entidade organizadora do mundial (é sempre bom lembrar, a FIFA não é dona do futebol, que está muito acima dela. A entidade só promove eventos) subverteu leis nacionais em prol de seus interesses. De todas as aberrações, a mais lamentável foram as remoções. Famílias inteiras, que tinham suas casas há anos em determinadas comunidades, foram forçadas a abandonarem seus lares para que as obras dos megaeventos (Copa e Olimpíadas) pudessem botar abaixo o que eles julgam velho e impertinente. Além do pouco diálogo e da truculência policial, vimos materializar o pior tipo de violência: aquela cometida pelo Estado contra o seu próprio povo. Fora os desvios de verba e os atrasos em obras importantes, eis a nossa vergonha maior por ter sediado este mundial. A “Copa das Copas” não foi a nossa. Foi a da Alemanha, em 2006.

Não sei se votarei em Dilma nas eleições de outubro. A certeza que tenho é a de que o país avançou, e a vitória de Aécio representaria o retrocesso de todas as conquistas, principalmente na área social. Marina fez uma campanha e tanto em 2010, apareceu como uma alternativa de destaque, mas tem metido os pés pelas mãos, também no intuito de agradar geral. Aí começa a passar por cima das próprias convicções. E alguém sem convicção, ainda mais um político, é alguém nulo, sem cara.


Nunca fui aquele patriota pachecão, que defende o Brasil só por ser brasileiro. Sempre procurei olhar o país por um viés crítico, entendendo que assim é a melhor forma de melhorar o lugar em que vivo. E o local onde nasci e pretendo morrer tem melhorado, o que não significa que não possa avançar ainda mais, seja com o PT ou com um partido que tenha isso como propósito. Nesse sentido, a função dos políticos é gerir com zelo os bens públicos. A nossa obrigação é politizar-nos, fazer as escolhas corretas e cobrar esse ou aquele representante de maneira devida.

2 comentários:

  1. .bom texto, Thiago.concordo plenamente com a segunda frase do penúltimo parágrafo.


    .abraço!.

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  2. Fantástico texto, Thiago. Os avanços no país nos Governos do PT são motivos de orgulho para mim, que sou petista. Mas, apesar das melhorias sociais, sei também que algumas reivindicações importantes ainda não foram atendidas, como o fim do fator previdenciário e a reforma agrária. Além de “ovo da serpente da corrupção”, a política de coalizão é a principal responsável pelo não atendimento dessas demandas populares. E também a responsável pela maior mancha na história do Partido: a ação Penal 470 (como foi um julgamento sem provas e sem considerar as contraprovas, prefiro não usar o termo Mensalão). Aliás, esse julgamento me preocupa não somente por ter sido executado para desmoralizar o PT, mas principalmente porque abre portas para que outras instituições de esquerda ou movimentos sociais possam sofrer no futuro esse mesmo tipo de apreciação. O que é um grande perigo!
    Para finalizar, acredito que você deve votar na Dilma 13, sim. E torço, e peço, para que isso aconteça. Não somente pelos avanços do país até aqui, mas pela perspectiva que sua reeleição representa. Afinal, ela faz parte de um Partido que tem em sua base pessoas, como eu inclusive, que se manterão fiéis à luta organizada da juventude e dos trabalhadores.
    Abraços

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