Eu entendo a carência do brasileiro. Falta a nós uma
referência, alguém que faça o povo sentir que o sistema funciona e orgulhar-se
disso. É essa lacuna que faz do futebol a nossa válvula de escape. A vitória no
campo redime o país dos fracassos na política, na economia (hoje menos) e, por
tabela, em educação, saúde, saneamento, segurança, moradia. Não há um
representante digno da admiração popular. Em parte, porque a política se
transformou num grande negócio. Em parte, porque votamos muito mal. E o círculo
parece se eternizar.
A solidão do brasileiro faz com que ele se torne inocente,
quase como a moça dos lábios de mel que cai no conto do vigário, entrega-se ao
primeiro homem que lhe diz coisas gentis, para depois lamentar a primeira – e
única – noite de sexo, sem qualquer telefonema que lhe dê esperança no dia
seguinte.
A metáfora da moça iludida cabe à relação que muita gente
criou com o ministro Joaquim Barbosa. É inegável o avanço de termos um negro na
mais alta Corte do país. É triste que a gente ainda tenha que enaltecer tanto
isso, prova de que um em meio a onze é algo muito pequeno prum país como o
Brasil, de tantas cores e misturas. Os Joaquins Barbosas deveriam ser mais,
mais rotineiros, pois o Brasil e o brasileiro merecem. Mas fazer do ministro um
herói nacional, como ocorre desde 2012, é falta de precaução.
Edição de 27 de novembro de 2013. Veja elege seu herói contra o partido que mais ama odiar. |
Barbosa, de fato, demonstrou intolerância com os crimes de
corrupção e foi indigesto aos mensaleiros do PT – ainda que seja pertinente
lembrar que muitos outros, de tantas siglas partidárias, estejam por aí, à
solta. Mas desde o princípio do julgamento da Ação Penal 470 Joaquim se excede.
O comportamento se acentuou ontem com o resultado dos recursos, em que
condenados como José Dirceu foram absolvidos (a contragosto do presidente da Corte) do crime de formação de
quadrilha, o que pode diminuir a sentença drasticamente, a ponto de alguns
deles estarem livres ainda este ano (sobre isso, http://g1.globo.com/politica/mensalao/noticia/2014/02/barbosa-critica-voto-e-diz-que-barroso-fez-discurso-politico-no-stf.html).
Por trás do desrespeito aos companheiros de toga e discursos
mais inflamados está o intento de candidatar-se a cargo público, algo que muda
bruscamente o teor do seu julgamento. Porque uma possível candidatura de
Barbosa – seja a senador, governador ou presidente – não garante que a sua
postura rígida com réus petistas tenha fundo político, mas abre uma margem
imensa para que se pregue exatamente isso.
E se o ministro fez o que fez pensando em não mais ser
ministro – como o mesmo declarou recentemente, ao dizer que já havia feito tudo
no STF –, mas num cargo eletivo qualquer, a rivalizar com candidatos do próprio
PT em eleições futuras? Pode não ter havido nada de excessivo. Pode ser
que a postura agressiva do julgador não teve como mote o “aparecer pra galera”.
Mas prudência na hora de eleger heróis nunca fez mal a ninguém. Joaquim, assim
como você e eu, é de carne e osso.
Como sempre coerente! Concordo "ipsis literis", mas ainda que se candidate a cargos não acredito em êxito! O que para o povo brasileiro não é bom, nem ruim, só será mais um político! Rssss
ResponderExcluirFantástico...
ResponderExcluirValeu, Ju!
ExcluirOs negros não foram bem representados dessa vez. O que ele fez e o grupo ao qual ele serviu somente a história vai revelar. Quem conhece de política e de justiça sabe o que ele fez. Assim que você ver alguém ser elogiado pela veja ou pela globo, coooooooorrrrrraaaaaa. Essa regrinha vale para qualquer situação.
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