terça-feira, 9 de outubro de 2012

MAIS IDEIAS E MENOS SHOW

Tive a oportunidade de assistir a um trecho do debate entre o democrata Barack Obama e o republicano Mitt Romney, candidatos à presidência dos Estados Unidos. O pleito norte-americano acontece em 20 de novembro. Tirando o fato de que Obama estava estranhamente desconfortável, o que favoreceu o adversário, mais incisivo, o confronto entre ambos serviu para escancarar ao Brasil que o nível das nossas eleições é raso. E é bem possível que a gente viva sob essa égide por mais algum tempo. Por aquelas bandas, o político encara a eleição com maturidade e seriedade, esclarecendo ao cidadão a real dimensão do contexto atual e daquilo que precisa ser feito.

Não que a lucidez e o tom civilizado devam ter presença integral ao longo de toda a campanha nos EUA, mas que a exceção à regra é o escândalo, a histeria, isso parece estar posto de modo bastante claro. Por lá, o que se viu foi uma discussão estritamente técnica, envolvendo temas como economia e saúde. Seria tolice da parte de Romney não apontar falhas nos quatro anos de mandato do seu oponente, mas tudo feito de modo educado e, o principal, oferecendo alternativas – viáveis ou não. Quem se interessar por acompanhar o debate completo da última semana entre os presidenciáveis americanos, sem legenda e dublagem, basta acessar http://www.youtube.com/watch?v=aYKKsRxhcro.

Aqui acontece o oposto. A despeito de algumas raridades, o candidato parte para a baixaria, às acusações pessoais, ou lança mão das frases de efeito, os clichês que acabam por tocar a carência e esperança do eleitorado mais órfão, mas que são desprovidos de consistência. Não é suficiente ao postulante a cargo político afirmar que “a população merece uma cidade melhor”, que “é hora da mudança”, que “juntos faremos uma sociedade melhor”. Eu ficaria perplexo se algum candidato pregasse o inverso disso. No país das maravilhas, a Alice sabe que tudo será feito, mas a forma como as benfeitorias serão viabilizadas é que é o cerne da discussão. Sobre as acusações, não adianta afirmar que o oponente é cretino, se o acusador não prova por A + B que é mais capacitado que ele.


Como a imprensa é responsável, na maior parte do tempo, por inserir na sociedade e na própria agenda dos candidatos a tônica da disputa, recai sobre o jornalismo o papel de exercer o seu trabalho com a frieza que pede a ocasião, sem vender uma neutralidade inexistente ou saltitar diante de picuinhas que não trarão benefícios ao pleito. Além de ter um lado, a imprensa brasileira é uma jovem atuante no processo eleitoral, porque o mesmo retornou há pouco mais de 20 anos, e isso faz dela incapaz em momentos pontuais da corrida. O nosso jornalismo, especialmente o mais robusto, ainda tropeça na vontade de fazer um bom trabalho e nos interesses escusos que perpassam as empresas midiáticas mais graúdas.

Além de canais de informação pouco maduros e políticos mal preparados – intencionalmente ou não – a outra ponta dessa equação é ocupada pelo próprio eleitor brasileiro, que ainda não possui bagagem suficiente para encarar um confronto mais maçante entre candidatos, onde se debatam problemas e soluções para as cidades. É muito mais agradável acompanhar troca de acusações ou uma aparição mais folclórica e humorada, do que se concentrar, informar-se e compreender uma discussão mais cirúrgica e propositiva. Embora o “Efeito Tiririca” tenha sido menos presente nessas eleições, há que se ter um eleitor menos alienado.

Enquanto a imprensa informa sobre este e aquele desvio do candidato, no passado ou no presente, enquanto a justiça se incumbe de punir quem se enquadra em crime eleitoral, civil ou penal, o cidadão olha para a disputa em Washington e percebe que Obama e Romney não teriam muita chance aqui. Porque, de um modo geral, o eleitor brasileiro entra na tendência avacalhada do nosso processo eleitoral, com frases bonitas e troca de animosidades gratuita, e se esquece de que é necessário aos postulantes discutir a cidade e suas carências. Ah, o votante se esquece também de que ele próprio precisa dialogar e tomar ciência sobre o lugar onde vive.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

A CÉSAR..., A DEUS...

Impressionante como política e religião se misturam cada vez mais, especialmente em período eleitoral. E não dá pra saber ao certo se o político irá corromper o religioso ou se este tornará o político alguém pior, tamanhas são as sacanagens nos dois âmbitos. Padres e pastores se candidatando não faltaram, assim como não faltou por parte de quem era candidato empenho em buscar apoio nas agremiações de maior apelo. As religiões agradecem.

Até 1889, ano em que houve o advento ao regime republicano, o Brasil tinha o catolicismo como religião oficial, ranço que ainda perdura num país que tinha tudo para ser liberal, mas é conservador como poucos. A levar-se em conta toda a opressão social e econômica sofrida ao longo dos anos, a nossa elite, afilhada dos interesses dominantes internacionais, é grata ao fato de o Brasil se enraizar nessa passividade revoltante. O fato é que a partir de 15 de novembro de 1889 esse país se tornou laico, e nada de limitar aos cidadãos, goela abaixo, esta ou aquela nomenclatura religiosa.

Algumas dúvidas surgem: não há choques entre empreender uma ideia religiosa, que busca abarcar pessoas, independente de outros posicionamentos, e ao mesmo tempo atuar na política partidária, que tem como marca ser uni ou bilateral, apenas? Os candidatos não usam suas condições de conselheiros espirituais para ganhar votos, já que arrebanham ali, em uma única seção ritualística, centenas de pessoas? O dinheiro que permeia as instituições religiosas não é taxado. Diante disso, como é usado esse capital? As “nomenclaturas da fé” que apóiam candidatos querem o quê em troca da coalizão?



Em suma, até por prudência, melhor não misturar as esferas, porque o “candidato cristão” sai em vantagem por se relacionar com uma massa que está ali, ao menos em tese, por questões espirituais, e não concretas, como é o caso da política, que além de lidar com problemas de ordem material tem como marca a troca de favores e influência e o conchavo de interesses. Convenhamos, não é – ou não deveria ser – por esse viés que a religião atua. Mantendo os templos fora da disputa, a religião volta a abranger como lhe é de dever, e não restringir. Sobre as finanças, assim como não acontece em poucos casos, a prática de reinvestir a verba doada por fiéis em veículos de comunicação é tão atabalhoada quanto tirar o dinheiro dos centros religiosos e levá-lo à política. Do contrário, é vantajoso ao extremo angariar o “capital de Deus”, limpo, sem escalas.

Não pensem as outras religiões que essa aliança questionável é privilégio só de católicos e evangélicos, enquanto os demais são inalienáveis. As duas religiões estão mais envolvidas nesse processo, pois são as que detêm o maior número de seguidores e, aos olhos da política, isso tem viabilidade hedionda. Se as demais fossem maiores, estariam igualmente ligadas à política. Nesse ramo, nada é feito sem barganhas, e as instituições menores não têm muito a oferecer.

No texto de amanhã, as diferenças entre as eleições daqui e dos Estados Unidos que, em 20 de novembro, definem o próximo presidente. O que a disputa entre Obama e Romney tem a nos ensinar.

domingo, 7 de outubro de 2012

GUTÃO É O NOVO PREFEITO DE GETULINA. DOS NOVE ATUAIS VEREADORES, SÓ TRÊS SE REELEGERAM

Uma hora e quinze minutos após o término das eleições, Getulina já sabia, pelo site do TSE, que seu novo prefeito, oficialmente, era Gutão (PMDB). O agora chefe do Executivo, que já fora vereador por um mandato (2001-2004) e vice-prefeito por duas vezes (2005-2008 e 2009-2012), conquistou o direito de administrar Getulina com 1990 votos (32,62%). Toninho Maia (PTB) ficou em segundo lugar com 1759 votos (28,84%). Em terceiro, Chiquinho (PDT), com 1593 (26,11%). Jota (PT) ficou em quarto lugar com 703 (11,52%) e Ulisses (PPS) recebeu apenas 55 (0,9%).

O eleitorado getulinense é formado por 8485 pessoas. Como 1929 se abstiveram, ou seja, 22,73% do total não foram às urnas, o eleitorado que compareceu foi de 6556, ou 77,27% do todo. Desses mais de 6 mil votantes, 6100 escolheram algum candidato a prefeito, enquanto que 283 anularam e 173 votaram em branco. Não restam dúvidas de que foi o pleito mais acirrado dos últimos anos, sendo que a diferença do primeiro para o terceiro não chegou a 400 votos. A baixa votação para Jota e, principalmente, Ulisses chama a atenção. O último não chegou a 1% das escolhas. Outro dado interessante em uma eleição com muitos candidatos e três deles polarizando os votos: o prefeito eleito teve pouco mais de 32% do voto popular, ou seja, 68% da cidade não tiveram em Gutão a sua principal escolha. Coisas da democracia.


Para vereador, tivemos: Edinedi (285 votos), Fátima Bernardes (267), Fio Caliani (246), Carlito (225), Maninho (220), Betobica (202), Diguinho (179), Motoradio (174) e Alcides Despachante (165). A questão do coeficiente foi decisiva para tirar da câmara dois dos atuais vereadores que foram bem votados: Toninho Lima (204) e Dinaldinho (182). Dos nove vereadores que estão atualmente na câmara de Getulina, só três se reelegeram: Carlito, Maninho e Betobica. Depois de um bom tempo, teremos novamente mulheres (duas) como legisladoras, e quiseram os eleitores que fossem elas as mais votadas entre os 74 candidatos. Aqui, dos 6556 votos, 6142 foram válidos, enquanto que 264 anularam seu voto para vereador e 150 assinalaram a opção “branco”.

No decorrer da semana, mais análises serão feitas por este blog, não só se restringindo a Getulina, mas dimensionando o pleito de modo geral.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

SE RUSSOMANO FICASSE QUIETINHO, NÃO SERIA O MONSTRO QUE É

Não que eu tenha certa propensão a gostar do Russomano, candidato do PRB à prefeitura de São Paulo. Ao invés. Celso Russomano surgiu para a política pelas mãos de Maluf, e quem tem ou teve qualquer relação com o dito cujo já está com a ficha suja, porque o descendente de libaneses é raposa, e não é de hoje. É evidente que o afilhado do engenheiro saiu do PP quando viu que o Don Corleone do partido continuaria a centralizar todas as ações nele, Maluf. Russomano queria ter vida própria, e, ao lado de Paulo Salim, o máximo que iria conseguir era ser deputado. Ele queria mais.

E não é que Russomano está na primeira posição na preferência do paulistano para assumir o cargo de prefeito? Por ora, bota os dois maiores partidos do Brasil no bolso, com Serra (PSDB) e Haddad (PT) empatados na segunda posição. O nanico aproveitou o apelo que tem com as classes menos favorecidas, conquistado na época em que era repórter sobre direito do consumidor, para surpreender os mais apressados. Não só isso. Aliou-se aos evangélicos, uma massa sem fim. De quebra, conseguiu dois benefícios: votos em bloco de uma classe enorme e unida e a grana dos fiéis, que entra e sai das igrejas sem pagar impostos e é usado sabe-se lá como. Russo tem a mão lavada aqui. Amanhã lavará a dos pastores? Política e igreja se misturando? Preocupante. De qualquer modo, moral da história: o candidato é figurinha certa no segundo turno do pleito, com “sérios riscos” de vencer a eleição municipal mais importante do país.


Falo em “riscos” porque é assim que a grande imprensa do estado enxerga Celso Russomano. Três momentos nessa corrida eleitoral foram marcantes: primeiro, Serra nadava de braçada e o noticiário, o mais neutro possível, posto que era desnecessário atuar em cenário tão calmo. Segundo, Russomano, com quatro mandatos de deputado federal, além de uma candidatura ao governo de São Paulo, em 2010, salta a primeiro e Serra corre o risco de nem ao segundo turno ir, em vista do crescimento do petista Fernando Haddad, muito em função das entradas de Lula e Dilma na campanha. A imprensa fica atônita. Terceiro, em dez dias Russomano despenca nas intenções, e, mesmo continuando na dianteira, vê a imprensa comemorar, pois agora a derrota no segundo turno é mais concreta.

O momento de apreensão do jornalismo paulista, quando da primeira colocação e manutenção na ponta do peerrebista, foi externado na série de denúncias que surgiu justamente nesse período. Que Russomano não deve ser flor que se cheire, não resta dúvida, já que quase ninguém é. Mas, dois questionamentos: Por que o lado podre do candidato apareceu somente depois que a sua vitória parecia consumada? Fernando Haddad e, especialmente, José Serra são tão puritanos, a ponto de parecerem anjinhos ao lado do capeta Russomano?


É que outra vez o nosso jornalismo tenta vender a aparência de isenção, quando na realidade nem precisaria. Soaria menos hipócrita. Porque muito mais fácil e profissional seria se os veículos declarassem publicamente que têm como preferência o candidato X, dizer por que o escolheram, porém tratar todos os concorrentes com igualdade de espaço e profundidade e compromisso com as informações, independente de que momento ou posição um ou outro se encontre. Seria bem mais digno e profissional, assim como ocorre nos Estados Unidos. Lá, as empresas comunicacionais deixam evidente de que lado estão, e mesmo assim conseguem atuar num nível de profissionalismo jornalístico à frente do Brasil.

Embora a sociedade esteja mais atenta às investidas da imprensa, os altos e baixos de uma eleição estão, mais do que se devia, à mercê do jornalismo que, por sua vez, decide a agenda do que aconteceu ou não. Os menos instruídos, aqueles que disponibilizam de poucos canais de informação, ficam mais vulneráveis ao que a imprensa gorda divulga. Mas daí a afirmar que o jornalismo decidirá um pleito é um exagero que não cabe para o ano de 2012. Mesmo Russomano não simbolizando uma ruptura, uma vertente revolucionária – aliás, longe disso –, sente na pele o desagrado dos brutamontes da informação. Ele se tornou o vilão que jamais seria se não incomodasse os também grandalhões, só que da política, Haddad e, principalmente, Serra.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

SUBSTITUIÇÃO NO TIME DO FUTEBOL: sai o placar, entra o dinheiro

Na minha infância, quando eu já era uma criatura apaixonada por futebol, esperava que algumas coisas relativas a esse esporte pudessem acontecer mais adiante. Talvez o jogo de botão, as camisas do glorioso São Paulo que compro desde 1991, quando ainda tinha seis anos, os títulos do clube e da seleção com os quais vibrei, as idas aos estádios (Morumbi e Maracanã entre eles) alimentaram em mim algumas esperanças que, hoje, se frustram.

Esqueçam o futebol como esporte, como disputa, como representação étnico-cultural que já fora outrora. O jogo de estádios abarrotados, acessíveis a quem quer que fosse. É bem verdade que o torcedor era jogado nas arquibancadas, sem o menor conforto e segurança. Mas, agora, a higiene é tanta, a sofisticação também, que o futebol que antes abarcava, agora exclui. Em campo, ainda se vê representada a mescla de etnias marcante no Brasil. Na platéia, a elite é cada vez mais assídua. Por isso, os cantos são mais fracos e o protesto é sem fundamento. Hoje, o cara vaia e, em seguida, sorri de lado. O amante do futebol de desde sempre quase não consegue mais entrar em um estádio, pois não se acha ingresso nem por R$ 10. Para o clube, é melhor ter a garantia de audiência em casa, negociando com a Globo os direitos de transmissão, do que encher estádios e dar de volta a esse esporte incrível a sua essência. Futebol é negócio, meu caro.

Quando pequeno, pensava na possibilidade de ver a seleção disputando uma Copa em casa. Hoje, às vésperas disso ocorrer, me pego querendo ver o time perder, de preferência pela Argentina de Messi, com requintes de crueldade. Mesmo assim, ainda hei de sofrer mais pela derrota de 1950 do que por esta, que, tomara, deverá vir em fase de quartas-de-final, no máximo. É claro que o time pode engrenar em dois anos, mas parece pouco provável que isso aconteça. Em outros tempos, como em 2002, a situação era ainda pior a um ano do mundial. Só que o time, sensacional.

  
O problema de hoje não é só a falta de treinamento adequado, mas o descompromisso do jogador, a falta de consciência do que representa vestir a camisa amarela. Soma-se a isso as falcatruas nos bastidores, especialmente com a construção e reforma de estádios. É inevitável gerar não em poucos o efeito contrário no torcedor, e este querer a desgraça, e não o êxito. É claro que uma coisa não exclui a outra, mas o pensamento é de que, se o Brasil perder, toda essa afronta terá vingança. Agora, falando friamente, o que começou irregular, irregular terminará, seja com vitória ou fracasso brasileiro.

Essa é a mesma seleção que convoca jogadores contestáveis. Mas daí a dizer que tudo acontece pelas ligações entre técnico e empresários é exagero. Imagine! Você com essa mania de ver maldade sempre... Mas que soa como interesse particular, e não técnico, tático e físico, não há dúvidas, algo que sempre houve. Em pequena escala, para não dar à vista, mas houve. Ninguém conhece o atleta, ele é convocado, está na maior vitrine que existe e, portanto, é valorizado a níveis estratosféricos. De um dia a outro inflaciona milhões, é vendido, e técnico e empresários lucram com a venda. Maracutaia? Claro que não, tudo coisa da sua cabeça...



Outro indício de que futebol é mais dinheiro do que esporte são os amistosos da seleção, comprados recentemente por uma empresa do Qatar. Por jogo, a CBF irá receber US$ 1 milhão para atuar onde e contra quem a ISE (International Sports Events) quiser, e não a torcida brasileira ou, ao menos, a própria CBF. Isso só até 2022, no mundial que irá ocorrer... no Qatar. Apenas coincidência? Claro que sim, ou você achou que a CBF negociou: “Você, Qatar, compra as partidas do Brasil e eu, Confederação, te escolho como sede da Copa de 22”. O voto de Teixeira, à época, foi esse, os jogos do Brasil são propriedades da ISE, empresa do Qatar, até 2022, mas não há nada de escuso nessa história toda. Nada!

Você está desiludido com o futebol, com a seleção? Acredita realmente que as convocações, a Copa e todo o resto têm manobras obscuras? Você é da opinião de que a corrupção de todos os lados está disseminada, que os ingressos estão demasiadamente caros para um espetáculo sem tanto valor? Você se indigna porque o elitismo invadiu os estádios e transformou as arenas em teatros, em salas de cinema? Dane-se você.

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

É IRRACIONAL – PORQUE IMPOSSÍVEL – QUERER VER TUDO

Após ser ordenado por Deus a disseminar o Seu nome aos demais, Moisés questiona: “mas quando eu chegar lá, dizer que falo em nome de ti e perguntarem quem és tu, o que digo?”. Respondeu Deus: “Diga-lhes que eu sou o que sou”.

Eu imagino que Moisés tenha ficado cabreiro, porém, obediente, atendeu ao pedido divino de propagar a quem quer que fosse o nome daquele com quem ele conversara, mas jamais vira. Nunca ninguém O vira, e isso causa nos homens regozijos e questionamentos.

Se eu estivesse no lugar de Moisés talvez não falaria, mas pensaria: “Ai, caramba! Como é que Ele quer que eu chegue a um lugar e diga a todos, depois de perguntado sobre quem é Deus, que Ele é o que é?”. A solicitação do Criador é indigesta, porque desprovida de qualquer referência.

Quando não conhecemos ou vemos alguma pessoa ou coisa, invocamos a necessidade de características que nos tragam, não o objeto ou o ser em si, mas a sensação deles. O cheiro, o som, uma descrição detalhada que contenha altura, largura, peso, cor, ajudam a nos aproximar do que não podemos ver ou tocar.


As religiões trabalham muito com isso, com os símbolos. É o testemunho que alguém dá em público, o sinal da santíssima trindade, as imagens de santos, as ofertas, os livros que servem como base às mais diversas nomenclaturas e as metáforas que tentam passar um entendimento maior acerca de algo distante. Tudo isso faz com que Deus ou qualquer outra entidade superior se achegue, torne-se mais real, já que a verdade nua e crua é distante.

Na sala de aula é assim também. Se o professor não trabalhar com exemplos, vídeos, fotos, atividade prática, adeus teoria. É por isso que os acadêmicos de Jornalismo, por exemplo, enaltecem o profissional do campo de trabalho. Porque o jornalista da rua torna palpável tudo aquilo que o estudante só ouve. Quando os exemplos da experiência vêm, pronto: é o esclarecimento. Se vier a dúvida, ótimo.

Pela limitação de todos nós, buscamos sempre uma ancoragem, qualquer referência em que possamos nos escorar. A gente busca a materialização de tudo para facilitar a compreensão e encobrir o comodismo de não refletir sobre nada que não seja cartesiano. E o Iluminismo apresenta uma necessária contradição: se comprovar tudo é impossível, ambicionar isso não chega a ter certa dose de paixão?

terça-feira, 18 de setembro de 2012

A MULHER E O HOMEM NUM RELACIONAMENTO: a história que os olhos contam ou escondem

De modo geral, o homem tem como característica ser mais contido que a mulher. Com uma exceção aqui e ali, o ímpeto e a delicadeza são traços marcantes femininos, ao passo que a contenção e a dureza marcam o sexo oposto. Enquanto o homem é paciente e ouve os seus iguais um de cada vez, a mulher fala sem parar, junto das demais, e para quem está de fora recai a tarefa indigesta de compreender o que estão a dizer. Sabe Deus como, elas se entendem, mesmo num aparente cenário de completo desentendimento.

Por falar incontrolavelmente, a mulher expõe às companheiras cada retalho da sua vida, mesmo porque escuta das outras passagens triunfantes ou fracassadas. É assim quando o assunto em trânsito são os relacionamentos. Numa conversa entre semelhantes, o papo feminino é aberto, sem pudores. Incensuráveis detalhes do primeiro encontro, do beijo inicial, da língua que não queria ir, mas foi. Da língua que desejava, mas recuou. E a primeira transa? Ah, a primeira transa... A mulher relata com paixão e poesia o ato afetuoso e instintivo. Se só afetuoso, chato. Se só instintivo, também. O fato é que ela comunica, na íntegra, todas as nuances. Ou para se gabar ou para imputar ao acontecimento uma idealização inexistente. Mas ela, incontida, e as outras, insaciáveis, falam e ouvem, ouvem e falam, falam, falam, falam.


O homem, não. É direto, reto e conciso. Num romance breve e descompromissado, ele abre a caixa preta da relação para jogar no ventilador cada mão ousada, cada beijo indiscreto, cada ato pecaminoso e divertido. Ali, a mulher é uma qualquer, desconhecida, alguém quase sem nome, sem vida e, justamente por isso e só por isso, o homem se diverte às suas custas, aproveita para elevar-se a uma grandeza que jamais possuiu, mas eis ali uma oportunidade para que ele minta para si e aos outros e seja visto como o homem que teve aquela mulher. Só que, da mesma forma, ela já fora, facilmente, de outros tantos. Da mesma forma, ele fora dela tão ridiculamente quanto.

Mas se a mulher com quem está não for apenas uma diversão momentânea, então ele com ela não está, mas é. E a redoma minuciosamente construída protege a mulher sua dos comentários alheios. O melindre é tamanho, que nem mesmo ele se permite mencioná-la. É sacra, está acima das palavras que tentarão, sem sucesso, defini-la, pelo simples fato de que aquela que o tem sob o seu domínio paira acima das descrições. Não há referências para caracterizá-la. Ela é o que é. A partir daí, todas as coisas que o casal confidencia são deles. Transformar o sumo belo em discurso, compartilhado com terceiros, é fazer da relação, do subjetivismo, uma pressuposição falível, desfigurada e banal. Para o homem que ama, seja o olhar ou o sexo, nada é ordinário. Essa sensação o intimida a falar, ele se cala, e nem Cristo é capaz de tirar uma revelação dessas.


A mulher, quando ama, fala. Ela torna público o seu contentamento, dividindo com as amigas os meandros da sua relação com alguém. A incontinência feminina torna terceiros cúmplices e parte do contato que tem com outro – ou outra. O homem silencia. Tem pra si, mesmo de modo inconsciente, que não revelar nada sobre ela é uma forma de cultuá-la. Nem o amigo mais fiel tem acesso ao que só o pensamento sabe. Ao contrário da mulher, ao ser impedido de enxerir na intimidade do quase-irmão, ele respeita sem esforçar-se, porque imprime, junto ao amigo, o mesmo sigilo sobre a mulher amada.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

HÁ ONZE ANOS, OSAMA

Há onze anos, nessa exata hora, o tal do Bush estava com a viola em caco, e resumia naquele momento a sua incapacidade que mais tarde completaria, pasme, oito anos de mandato. O texano era o cara errado, na hora errada – ou seria certa? Um ano antes, em uma eleição duvidosa, o republicano ganhou o direito de presidir os Estados Unidos, numa disputa com o democrata Al Gore, então vice de Clinton. Com menos de um ano de gestão, Bush estava com um Osama na mão e duas torres no chão.

O que no início se desenhava como um problema, mais adiante serviu como o trunfo de W. Bush ao segundo mandato, que conseguiu sem grandes dificuldade e indícios de fraude. O presidente usou a sensação de medo, o sentimento de impotência e de que alguma coisa poderia acontecer a qualquer momento para implementar na população americana a dependência do Estado, invertendo-se perigosamente a lógica: a política passava a ser maior que o povo. Os atentados de 11 de setembro, contraditoriamente, foram perfeitos aos anseios de Bush. Ele era, a partir dali, o herói protetor de que tanto os Estados Unidos precisavam.

Lembremos de Bin Laden. Durante a Guerra Fria, Estados Unidos e União Soviética disputavam o alinhamento dos demais países ao capitalismo e socialismo, respectivamente. Quando o exército soviético chegou ao Oriente Médio, o governo americano precisava criar uma força de resistência ao avanço vermelho. No Afeganistão, tente arriscar quem foi financiado e treinado pelos Estados Unidos. Sim, o barbudo mais conhecido, amado e odiado do planeta.


Naquele 11 de setembro, eu ainda na escola cursando o terceiro colegial via a mídia lamentar e o mundo, escandalizado, a acompanhar o que causara tudo aquilo. Ninguém sabia, porque o desconhecimento da história é algo tocante. As bombas soltas em Hiroshima e Nagasaki são eventos normais. As torres incendiadas, não. Guantânamo e o embargo a Cuba, normais. O World Trade Center vindo abaixo, não. O incentivo às ditaduras na América Latina, inclusive no Brasil, coisa pouca. Os atentados, uma afronta. Tudo isso é uma tolice, e deixemos de fora o chororô só pra um dos lados.

É necessário saber analisar tudo aquilo com certa frieza: os mais de três mil mortos no 11/09 eram inocentes. Os que morreram por mãos americanas, também. E não é difícil compreender, até porque um certo físico já propusera: para toda ação existe... Isso mesmo. É muita cafajestagem – e burrice – estraçalhar os outros e julgar que nada acontecerá de volta e, quando ocorre, dar chiliques. Embora Deus me reprove e o capeta vibre, confesso: não me chocou e entristeceu em demasia ver o WTC ruir tão facilmente.

Os mortos naquela manhã de setembro pagaram injustamente pela política externa americana praticada durante anos. Porque em guerras ou em disparates deste nível, os culpados normalmente se escondem, e resta à vítima inglória morrer. Por falar em morte, vítima e Estados Unidos, há exatos 39 anos, também em um 11 de setembro, era deposto, para logo em seguida morrer, Salvador Allende, presidente chileno eleito democraticamente, trocado à força pelo ditador Augusto Pinochet, pois não era visto com bons olhos adivinhe por quem?

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

ESQUEÇA O IPIRANGA, A ESPADA E O GRITO

Celebrar o quê? A nossa independência comprada? Desde quando algo conquistado sem luta tem valor comemorativo? O nosso 7 de setembro foi tão “papo pra boi dormir”, que D. João VI, rei de Portugal, deixou de ser a principal autoridade para D. Pedro I, seu filho, assumir o posto de imperador do Brasil, que, mais adiante, seria do neto, D. Pedro II. Está explicado o nosso atraso político, a morosidade com que as coisas acontecem por aqui até hoje.

Eis aí uma parte da história dos Estados Unidos que me é convincente. Os caras pelejaram pela liberdade, foram a campo lutar, porque quem ganha o direito de ser livre não o é, de fato. Quem dá a liberdade pode tirá-la ou dosar da maneira que lhe convier. Aqui foi assim, sem bagunçar a ordem vigente. Ficou mais fácil aos abastados, e a população olha o feriado de hoje com descaso absoluto, sem compreender o que é emancipar-se.


No Brasil, além de não vir a República, em 1822, a estrutura sócio-econômica, encabeçada pelos próprios portugueses e elite agrária brasileira, ficou como estava. A mudança, no Brasil, foi só de nome – saiu da condição de colônia à de império –, mas essencialmente tudo se manteve. Sem revolução, as hierarquias foram mantidas e nada se sujeitou ao rompimento.

Não é de se estranharem alguns retardamentos: a mulher em condição de desprivilegio no mercado de trabalho; o negro que, embora em grande quantidade no meio social, é escasso nas plateias de cinemas, teatros, faculdades; o tradicionalismo moralista das religiões tenta emperrar avanços úteis ao homem.

Os enraizamentos são fortes. O Brasil avança, sim, mas a demora em alavancar-se parece ser a nossa maior vocação.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

INTIMIDAÇÕES

Quando o homem é só um menino, qualquer garotinha bonita que se insinue faz dele um inseto, uma coisa qualquer, insignificante à máxima potência. O que é um pequeno macho, vestido de camiseta listrada, bermuda até o joelho, meia, tênis e cabelos rigorosamente penteados perto daquela que é, com simplicidade, a mais arrebatadora das miniaturas?

Sem premeditar a sedução, porque a criança, ao contrário de gente grande, ainda não aprendeu a ser má, ela bota o novato em posição desconfortável, tateando até o desprezo, pois a mulher é isso desde sempre: ela tem rosto, voz, jeito e autoridade para tornar o outro diminuto, fazendo com que a sua imposição seja aceita de bom grado.


Aos olhos do adulto, a criança homem não se diferencia da mocinha, de modo que até uma certa idade ninguém ainda sabe do que irá gostar. Mesmo sob o tempo em que se tem uma idéia bastante incompleta sobre os relacionamentos e os afetos, a mulher já é imponente, e cabe ao homem resignar-se nos seus próprios medos e na boa vontade da menina que ele anseia.

Mas as práticas inverteram-se. A mulher não espera, ataca. Deixou de ser o alvo para atuar como seta. Ela vai atrás do que quer, porque antes não podia ter o que queria. Se o dedo do homem a apontasse, lá ia domesticável, só pelo fato de que “o papel da mulher era aquele”, endossado pelos homens, pela igreja e pelas próprias mulheres, algumas delas ainda com saudades “daquele tempo”.


Ainda assim, na comunidade infantil a coisa pouco mudou. Embora isenta de maldade, a criança tem a franqueza que faz dela, não em poucas vezes, uma indigesta engraçada. A naturalidade com que ela debocha e acolhe, ao mesmo tempo, faz das diretrizes modernas impropérios diante do tradicionalismo mirim. Nesse caso, a menina, em sua maioria, ainda não se dá ao desfrute.

Mesmo nessa época de indefinições do papel de cada um no jogo de conquista, há homens aos montes que tremem diante de uma bela mulher. Isso significa que a mulher feia é um ser humano menos elevado que as demais? Não. Significa que ela não tem feições e porte a ponto de provocar no homem a sensação de inferioridade, de fazer a mão gelar e suar, não tornar saltitante o peito masculino, não dar às suas pernas o estremecimento e, tampouco, não fazer a voz gaguejar, deixando as palavras – todas – sem fim. Ou seja? Ela é feia. Ponto.

É de se lamentar o homem que não sucumbe ante a um “não” ou ao receio da negativa. Só o fato de querer alguém e suspeitar uma recusa é o que nos tira da zona de conforto. Quantos recuaram, em virtude do medo de serem recusados ser maior que tudo? Quantos, desses mesmos, não se arrependeram, pois podiam ter ao menos tentado? Quem abole o friozinho na barriga não vive os desenganos e os sabores da vida.