É como se a
violência urbana, que abocanhou pontos específicos do Rio de Janeiro até pouco
tempo atrás, tivesse tomado a ponte aérea. Sim, ela está em São Paulo, capital
do Estado mais rico do país, cujo lema é Non
ducor, duco (Não sou conduzido, conduzo). A Pauliceia está sem as rédeas da
situação, sofrendo com policiais mortos em madrugadas violentas, o que para uma
cidade do tamanho dela não é nada bom. O prefeito e o governador sucumbem,
outra vez, ao poder paralelo. Kassab já está resignado, e sabe que Dilma é a
única salvação – e olhe lá – para o cenário. Isso porque o político emergente
saiu do time PSDB-DEM para jogar no PT-PMDB, pois, de acordo com as novas
diretrizes do partidarismo brasileiro, político que preze a evidência, e não o
fracasso, joga com Lula. Alckmin, não. Prefere manter uma pompa – e uma força –
que não existe. Está encurralado, e, se não gritar, vai perder.
Primeiro, é
evidente, todavia não devesse, que uma tomada de decisão mais pontual passa
pelo interesse da política partidária, ainda que o bom senso mostre ao mais
ingênuo que a situação é temerária, de âmbito civil. Tudo é muito simples: se
Geraldo Alckmin reconhecer que a situação fugiu ao controle e, com isso,
solicitar ajuda federal, como fez o Rio, é atestar-se incapaz, pondo na
berlinda uma pretensão sua ou do PDSB ao cargo maior em 2014. Se ele não
recorrer ou demorar mais a fazer isso, será negligente. Exatamente! Tudo é
pensado de acordo com o poder. A sociedade e, neste caso, a preservação da vida
são elementos secundários nesse processo político. Por isso, o tucano recusa
ajuda de Brasília, o que é de uma mesquinharia tremenda, assim como será também
quando Dilma, na campanha eleitoral, daqui a menos de dois anos, jogar na cara
do candidato adversário que, se não fosse por ela, SP teria sangrado mais. A
política é isso, meu caro.
Outra marca do
ataque de criminosos contra policiais é a aceitação com que a população recebe
o acontecimento. Muito em função da sociedade ser passiva, como é do feitio brasileiro
desde que os portugueses botaram os pés aqui, com algumas louváveis exceções. Muito
também porque boa parte das pessoas enxerga na polícia mais uma inimiga do que
aliada. E tudo por um motivo bastante claro: a polícia também mata. O que ela
recrimina dos ataques que sofre, é o que protagoniza. Não se fala aqui do
confronto armado, em que é matar ou morrer. Fala-se aqui de execuções, e a
polícia de São Paulo, sob o ensinamento de Paulo Maluf de que “bandido bom é
bandido morto”, mata quando não há necessidade, ao invés de fazer o mais
simples, prender. É como se a polícia agisse com rigor, sem ser preciso, e se
omitisse quando a ocasião é de enfrentamento. Nessa toada, já fez muito
inocente defunto.
Nem todos os
policiais se enquadram nisso. Além de ganharem pouco e serem mal treinados e
equipados, dedicam-se a uma profissão arriscada, colocando em xeque a sua
integridade, correndo o perigo de deixarem filhos e esposa. Mas não são
raridades os PM’s que se acovardam no momento em que precisam aparecer, ou que
se agigantam para aplicar multas de trânsito, ou que se aliam ao próprio crime,
ou que assassinam bandido ou não. Um pouco de cada falha, que se repete não na
maioria da corporação, mas em grande escala, tem parcela de responsabilidade no
que se vê agora em São Paulo.
A ideia de
separar os principais responsáveis pela onda de ataques, colocando-os em
presídios distantes e desarticulando a espinha dorsal do PCC, simboliza a
falência, aí não da polícia, mas das políticas de segurança pública. Como se as
facções criminosas se comunicassem pessoalmente, e não por celulares, que
entram aos montes nas penitenciárias de todos os lugares. Não adianta separar,
mesmo porque as operadoras de telefonia celular oferecem promoções imperdíveis
envolvendo ligações entre Estados, SMS entre operadoras diferentes e acesso à
internet. E quem comanda o crime de dentro das prisões sabe e acessa as
facilidades de comunicação.
A solução não é
fácil, mas há guerras civis por aí, inclusive na Colômbia, que são bem mais
complexas que as nossas. Por enquanto, é só dar à PM melhores condições de
trabalho e tirar dela a prática atrasada, de matar por matar, que nivela a
corporação aos criminosos quando assim ocorre. Ao Estado, cabe financiar esse
avanço, preparar leis que punam o infrator, seja ele policial ou não, e tentar
conduzir a situação com mais zelo à sociedade e menos interesse político. Ao povo,
cairiam bem o protesto e um voto nos projetos que priorizem um país mais
moderno, não só na engenharia, mas na mentalidade.
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