O que nos faz buscar
sempre um culpado? Quase nunca é a gente, quase nunca são vários. O dedo
apontado a alguém encerra o assunto, resume a história e a nossa angústia de
não saber quem foi ou de supor que sabe, arrefece. Comodismo e negligência com
os fatos fazem a realidade ser incompleta ou mentirosa. Mas a nossa impaciência
– digo, má fé – em ter total domínio de inocentes e culpados tem resquícios lá
atrás.
Quando Jesus foi aferroado
na cruz, fez-se a conversão da história toda em uma pessoa. Nem o desaparecimento
do corpo, o Cristo ressurreto e sua aparição não tiraram de Judas a condição de
vilão exclusivo. Não se pretende aqui anular o papel de Iscariotes, torná-lo o
injustiçado. Ele errou feio ao trocar Cristo por 30 moedas de prata e entregar o filho do Homem com um beijo, mas
equivocado malhar só ele.
De todo conjunto
que permeava a realidade da época, havia um sistema instituído que impelia qualquer
tentativa de revolução, de se romper com o panorama vigente. Algo similar ao
que sucede hoje? Sim, assim era e sempre será. Os que detêm o controle
ideológico, político e econômico são os mesmos nas três instâncias, com raras
possibilidades de quebra dessa tendência.
A linhagem de
poder romana e judaica não dava brechas ao pensamento transgressor de Jesus. Trocando
em miúdos, o nazareno causava desconforto às autoridades daquele período. O que
falava e da forma que agia serviram como pretexto para os algozes fazerem o que
fizeram. E, nesse sentido, Judas não foi mais culpado que Herodes, Caifás e
Pilatos. Não nos esqueçamos também de Pedro, sobre o qual o Messias edificara a
sua igreja. Simão negou o predestinado três vezes, sem contar no cochilo dos
apóstolos em hora imprópria.
Seja no esporte,
na rua, no trabalho, na faculdade ou dentro de casa, é quase que obrigatório
alguém receber a culpa solitariamente. A necessidade de nomear um, e não a si
mesmo ou a vários, tranqüiliza a consciência, tira o peso de não ser capaz de
enfrentar o enigma insolúvel. Pensa aí se você nunca passou por isso, se em
momento algum apontou o dedo pra se livrar da culpa ou encurtar discussões.
Caso chegue à conclusão que sim, não
me venha você botar a culpa em mim. Culpa sua, oras. Minha, jamais.
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