Poderíamos ser,
então, o país do judô, da natação ou do iatismo, talvez. Mas a história tem dos
seus caprichos e ela quis que o Brasil vibrasse com a bola nos pés, com a bola
na rede. Como quem diz “o que é teu está guardado”, o destino olhou para esse
bando de mulatos, cafuzos, mamelucos, pretos e brancos e julgou que o futebol poderia
imitar a vida, parafraseando Oscar Wilde. E assim foi.
O acontecimento
decisivo contradisse as expectativas. Era a quarta Copa do Mundo, e depois de
duas edições canceladas (1942 e 1946) em virtude da segunda guerra mundial, as
principais seleções do mundo chegavam ao Brasil para a disputa do torneio entre
selecionados mais importante.
Brasil, Uruguai,
Espanha e Suécia formaram um quadrangular final, por terem ficado em primeiro
lugar em seus respectivos grupos. Coincidiu que, no último jogo, os rivais
sul-americanos se enfrentaram em condições de conquistar o título, pois
venceram seus jogos ante os europeus. Mesmo com a vantagem do empate e tendo
saído na dianteira do placar, um Maracanã com 200 mil pessoas viu a seleção
ruir e os uruguaios comemorarem o bicampeonato. Éramos os vira-latas de Nelson
Rodrigues.
O contraditório
está aí. A derrota não só serviu para a seleção abandonar o uniforme branco,
como para fazer-nos querer a Copa ainda mais. Oito anos depois do Maracanazzo, o Brasil com Pelé e
Garrincha levantava a taça, exorcizava seus medos, entrando definitivamente na
rota do futebol. Ao invés da decepção nos afastar do esporte, fez-nos salivar
pelo primeiro título. Ao gostar daquilo, vieram outros quatro e sabe-se lá
quantas lágrimas já não rolaram ao vermos vitórias argentinas, italianas,
francesas e holandesas sobre nós.
Se o Brasil
tivesse vencido aquele mundial, a nossa paixão teria sido ainda maior ou
acomodaríamos. Mas se o evento de 1950 tivesse acontecido em outro país e a seleção,
perdido, aqueles três esportes – ou outro qualquer – poderiam ser o que o
futebol é.
E se o Brasil fosse
o país do judô? Imagine o brasileiro grudado na TV, xingando o juiz que puniu o
judoca injustamente, reclamando com o atleta que está em desvantagem no jogo de
mãos. E na hora dos golpes? A cada possibilidade de yuko ou wasari, uma
expectativa a mais, uma unha a menos. No momento do ippon, o dorso do
adversário – de preferência argentino – batido no chão, um pulo, o soco no ar e
o grito de “é campeão”.
Mas o Brasil
poderia ser o país da natação. O público atento às braçadas, reunindo-se em
bares a torcer pelo segundo a menos. Insatisfeito com Thiago Pereira após um
quarto lugar, a não medalha, e os confrontos nas ruas começariam. O torcedor
chamaria Cesar Cielo de “pipoqueiro” por se recusar a nadar o revezamento
4x100. Impossível não pensar na torcida vestindo o maiô, beijando a bandeira
brasileira em dia de decisão na natação, para comemorar mais um título.
Poderíamos ser o
país do iatismo também. A torcida seria a caráter: colocaríamos a vela no
centro da sala. Saltitando de um lado a outro, simulando instintivamente o
melhor vento. Ao passar pela baliza final, o choro da torcida, o grito que
impõe o nome de Robert Scheidt em meio a palavrões, exultando o campeão, a sua
conquista, o nosso contentamento.
Viu só? Não seria tão ruim assim ter outros
esportes principais. Torcer pela braçada mais veloz, pelo golpe certeiro ou
pelo vento na cara, sem ninguém à frente. Se o Brasil não tivesse sido derrotado
em 50, dentro de casa, talvez não ligaríamos tanto a TV para assistir à bola
rolar na grama. Mas a seleção perdeu aquela Copa, venceu outras cinco depois e
nessa altura do texto nos vemos contentes ou não com as participações
brasileiras em algumas modalidades olímpicas. Mas, isso à parte, rola agora um
futebolzinho com os amigos ou algum jogo na TV?
Brasil é o país da festa. Tudo o que é festa generalizada, vira marca indelével na história e no comportamento nacional.
ResponderExcluirErrado : se o Brasil não fosse o país do Futebol, talvez seríamos o país do Críquete ou do Rugby, pois eles tbm foram introduzidos no Brasil por Charles Miller.
ResponderExcluir