terça-feira, 14 de agosto de 2012

O TAMANHO DO TEXTO É PROPORCIONAL À REVOLTA

por Giovanna Betine

O argumento de todo jornalista que não defende o diploma é sempre o mesmo: "eu matava aula, não entregava trabalhos e hoje sou um profissional de sucesso". E desde quando isso confere legitimidade para não se cursar uma faculdade? Por que tomar um caso particular e a partir disso concluir que a formação superior não é importante?

Lembrando que nenhuma 
graduação capacita um estudante a se tornar um âncora no dia seguinte à colação de grau. Mas o objetivo da Universidade nem é este. Jornalistas "de mercado" estão acostumados a dizer que aprenderam na prática e não no banco da sala de aula. Dizem também que os professores estão distantes da prática para poderem ensinar, de fato, seus alunos. Bem, já participei de algumas bancas de TCC onde jornalistas "da prática" eram avaliadores. Resultado? Tinham dificuldade em aprofundar qualquer conhecimento sobre cultura, sociedade, ciência política. Truncavam seus pensamentos e não sabiam demonstrar ao aluno avaliado qualquer profundidade de análise. Mecanizados pelo mercado, estes jornalistas não enxergavam que além do lead, há o conhecimento do conhecimento (ou ao menos sua busca). Alguns desses avaliadores, após a banca, confessaram que foram surpreendidos por autores que falam com lucidez o que eles enfrentam no dia-a-dia. E completaram dizendo que, se tivessem buscado tais conhecimentos teóricos antes, saberiam conduzir melhor a prática.


Argumento pobre é o STF dizer que a obrigatoriedade do diploma impede a liberdade de expressão. Oi? Já pode rir? Economistas, sociólogos, advogados, engenheiros, filósofos etc, devem, sim, ter seus espaços resguardados para a publicação de artigos, colunas e crônicas. Mas a reportagem é jornalística. Assim como a apuração. Discute-se que um jornalista não entende de economia tanto quanto um economista e por isso poderia comprometer a notícia. Sou da opinião que TODO jornalista deveria passar por uma redação de jornal, pois ali se faz de tudo. Mas também penso que é preciso se especializar sempre. Ora, se gosto de cultura devo buscar uma pós, um mestrado, que me capacitem ainda mais para tal. Se eu quiser me enveredar pela cobertura política, tenho que superar a graduação e concentrar meu aprimoramento profissional no estudo do jornalismo político. Só a graduação é pouco, mas um "pouco" que é essencial.

Quando lecionava a disciplina de "Ética" no curso de Jornalismo, na minha primeira aula eu dizia aos alunos, "não vou ensinar ninguém aqui a ser ético". E continuo pensando assim. Ética vem de berço. Mas como diz Eugênio Bucci, só existe discussão ética onde há conflito. Essa é a essência da faculdade: a discussão, o questionamento, a pergunta, o confronto. Justamente porque a técnica (que deve, sim, fazer parte dos cursos) o mercado vai ensinar (ou estragar). Agora, jornalista que chega sem embasamento no mercado morre agarrado à pirâmide invertida e conivente ao seu editor.


O grande problema é a falta de leitura. Graduando que não quer ler Literatura, que não se interessa por História, que nunca leu Filosofia. Eis o desafio das perseguidas faculdades de Jornalismo: incentivar mais a leitura além do que é jornalístico. E este é meu desafio como jornalista e professora: plantar em meus alunos o gosto pela literatura, ainda que nem sempre eu consiga. Jornalista que não lê, não vai pra frente. Minha mãe costumava me dizer: "minha filha, como jornalista você tem que ler até bula de remédio"...rs...

Há muitos estudantes péssimos se formando por todo o Brasil. Pessoas sem bons textos, vago conhecimento e, principalmente, já dispostos a entregarem os pontos a práticas de comunicação levianas. Esse mau profissional terá seu diploma em mãos assim como o bom estudante que se forma. Entretanto, defender que a demanda de maus jornalistas justifique a queda do diploma é sofisma. Há médicos matando e assediando pacientes por aí, advogados se "prostituindo" a olhos nus. Engenheiros cujas casas não resistiriam a um sopro. Ah, e pedagogos que ainda falam para "mim" fazer. Vamos retirar, então, as faculdades de medicina, direito, engenharia e pedagogia também?

Muito do que li até aqui busquei por conta própria. Se conheço um pouco de Machado, Clarice, Guimarães, Saramago, Pessoa, foi porque fui incentivada a isso desde criança. Mas ter cursado Jornalismo foi uma das grandes decisões da minha vida. Tive excelentes e péssimos professores. Mas aos excelentes sou eternamente grata por terem me feito sair de dentro da caverna de Platão. Na verdade, às vezes ainda me pego entrando na caverna e enxergando por sombras. Mas isso já é culpa minha. Sou grata à graduação de Jornalismo como um todo. Se eu tivesse trabalhado numa redação ou assessoria sem passar pelo estudo, eu desconheceria a complexidade midiática e talvez acreditaria que jornalista é "formador de opinião".

Pode até parecer que as teorias do jornalismo e da comunicação não exerçam influência no fechamento de um jornal. Mas o editor que não souber o que é valor-notícia, agulha hipodérmica e os meandros da indústria cultural, não vai (NÃO VAI) atender, na essência do que isso significa, o interesse público. Dessa forma, não terá credibilidade.

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