sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

O HERÓI JOAQUIM BARBOSA PODE SER UMA FARSA


Eu entendo a carência do brasileiro. Falta a nós uma referência, alguém que faça o povo sentir que o sistema funciona e orgulhar-se disso. É essa lacuna que faz do futebol a nossa válvula de escape. A vitória no campo redime o país dos fracassos na política, na economia (hoje menos) e, por tabela, em educação, saúde, saneamento, segurança, moradia. Não há um representante digno da admiração popular. Em parte, porque a política se transformou num grande negócio. Em parte, porque votamos muito mal. E o círculo parece se eternizar.

A solidão do brasileiro faz com que ele se torne inocente, quase como a moça dos lábios de mel que cai no conto do vigário, entrega-se ao primeiro homem que lhe diz coisas gentis, para depois lamentar a primeira – e única – noite de sexo, sem qualquer telefonema que lhe dê esperança no dia seguinte.

A metáfora da moça iludida cabe à relação que muita gente criou com o ministro Joaquim Barbosa. É inegável o avanço de termos um negro na mais alta Corte do país. É triste que a gente ainda tenha que enaltecer tanto isso, prova de que um em meio a onze é algo muito pequeno prum país como o Brasil, de tantas cores e misturas. Os Joaquins Barbosas deveriam ser mais, mais rotineiros, pois o Brasil e o brasileiro merecem. Mas fazer do ministro um herói nacional, como ocorre desde 2012, é falta de precaução.

Edição de 27 de novembro de 2013. Veja elege seu herói contra o partido que mais ama odiar.

Barbosa, de fato, demonstrou intolerância com os crimes de corrupção e foi indigesto aos mensaleiros do PT – ainda que seja pertinente lembrar que muitos outros, de tantas siglas partidárias, estejam por aí, à solta. Mas desde o princípio do julgamento da Ação Penal 470 Joaquim se excede. O comportamento se acentuou ontem com o resultado dos recursos, em que condenados como José Dirceu foram absolvidos (a contragosto do presidente da Corte) do crime de formação de quadrilha, o que pode diminuir a sentença drasticamente, a ponto de alguns deles estarem livres ainda este ano (sobre isso, http://g1.globo.com/politica/mensalao/noticia/2014/02/barbosa-critica-voto-e-diz-que-barroso-fez-discurso-politico-no-stf.html).

Por trás do desrespeito aos companheiros de toga e discursos mais inflamados está o intento de candidatar-se a cargo público, algo que muda bruscamente o teor do seu julgamento. Porque uma possível candidatura de Barbosa – seja a senador, governador ou presidente – não garante que a sua postura rígida com réus petistas tenha fundo político, mas abre uma margem imensa para que se pregue exatamente isso.


E se o ministro fez o que fez pensando em não mais ser ministro – como o mesmo declarou recentemente, ao dizer que já havia feito tudo no STF –, mas num cargo eletivo qualquer, a rivalizar com candidatos do próprio PT em eleições futuras? Pode não ter havido nada de excessivo. Pode ser que a postura agressiva do julgador não teve como mote o “aparecer pra galera”. Mas prudência na hora de eleger heróis nunca fez mal a ninguém. Joaquim, assim como você e eu, é de carne e osso.

4 comentários:

  1. Como sempre coerente! Concordo "ipsis literis", mas ainda que se candidate a cargos não acredito em êxito! O que para o povo brasileiro não é bom, nem ruim, só será mais um político! Rssss

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  2. Os negros não foram bem representados dessa vez. O que ele fez e o grupo ao qual ele serviu somente a história vai revelar. Quem conhece de política e de justiça sabe o que ele fez. Assim que você ver alguém ser elogiado pela veja ou pela globo, coooooooorrrrrraaaaaa. Essa regrinha vale para qualquer situação.

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