terça-feira, 31 de julho de 2012

NINGUÉM É IMPUNE À MORTE

Quando a morte se agiganta, temê-la, resignar-se ou cumprimentá-la? Sendo o projeto mais certo da vida, a morte tira do homem aquilo que mais ama. Embora repleta de prejuízos, a vida terrena permite aos mortais privilégios irrecusáveis, em sua maioria de ordem material. É quando o ser busca recursos diversos, como cirurgias plásticas, alimentação regrada e a religião, na tentativa de adiar o fim. Mas o fim é inexorável e ele chegará a mim e a ti, seja agora, no momento em que lê este texto, ou depois.

A dúvida do que virá a seguir angustia o homem que, embora pense muito, é incapaz de esclarecer o mistério. As religiões poderiam trazer as respostas, mas, conforme-se: elas também são formadas por homens, e a nossa limitação, enquanto seres carnais, manterá uma incógnita. A interrogação pode nos atrapalhar, confundir os raciocínios, mas se ela for útil para realizarmos melhor o nosso papel, justamente por termos uma noção pouco nítida acerca do porvir, já será qualquer coisa positiva.


Pragmático que é, o homem se amedronta com as possibilidades posteriores incertas. É evidente que você e eu, após morrermos, podemos encontrar Jesus, Madre Teresa e Gandhi, isso se o nosso destino for os céus. Porque se a danação eterna nos espera, o mais manso dos condôminos do inferno será Hitler, uma criatura que, para os padrões do capeta, é de uma sensibilidade enorme. Se a partida preceder o encontro com o austríaco, não hesite em achar que algo não muito bom tenha sido obra sua. Se desembarcar por aquelas bandas, tenha certeza: haverá maldade, escuridão e seres assustadores, mas prepare-se para mais, porque de assanhamento despudorado o inferno está tomado.

Deixemos o inferno de lado, pois se você lê este texto e acessa o blog diariamente, é ponto consumado que o seu destino é o paraíso. Pobre daquele que não aderiu ao costume de vir aqui todos os dias... Como seriam os encontros pós-vida, se o corpo ficou aos bichos? Perceba que o nosso inconsciente tenta reproduzir na morte características da vida. E se a carne ficou, a nossa inteligência e memória também serviram de comida a seres minúsculos. Se tudo isso é enterrado ou cremado, o homem não será nada no além, a não ser que raciocínio e lembrança sejam também ou somente de ordem espiritual.

Ainda vivos, amedrontamo-nos com a ideia de não haver nada depois. Repugnamos a possibilidade de adormecer e só. Viver tanto, passar por inúmeras experiências, usar a inteligência para viabilizar maturidade ao espírito, e simplesmente apagar e não ter mais nada? Essa chance perturba o bom senso, faz com que alguns se acomodem nela, mas raros os que não pensam nisso.


Quando a morte não nos é, pega alguém próximo. Na juventude ou na velhice, não há uma que seja bem-vinda. Esta ou aquela pode doer mais, arranhar o sentimento dos que ficam, mas a perda é inconsolável. Quando alguém próximo se vai, uma parte da nossa história se afunda e não mais volta. Leva pra debaixo da terra um pedaço de quem ficou e aborrece quem respira, até o espírito – de novo ele – acalmar-se, conformar o físico, arrefecer a mente e vida que segue.

A equação insolúvel apequena o homem. As dúvidas e o temor nos confundem e submetem a razão. Se a igreja vem com o intuito de religar o homem a Deus, a tarefa fica prejudicada porque a autoridade moral de que o homem tanto necessita para estabelecer o elo esvaiu-se. A religião pode ter a sua utilidade, pode diminuir o que está confuso, fazer com que o medo regrida, mas voltar-se às próprias entranhas, no intimismo silencioso, pode melhor preparar o homem para a morte. Ela que nos espera ansiosamente, esperançosamente, para o que de bom ou ruim pode nos ocorrer depois.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

A BOLA NA REDE OU O SEGUNDO A MENOS

É evidente que eu prefiro futebol. Esse esporte que veio no encalço da guerra, em aproximadamente 2 mil a.C. na China, e que empolga os corações nossos e nos faz agir desmedidamente, variando da loucura ao patético em questão de segundos. O mesmo que manipula multidões, submetendo os ouvidos da massa a um rádio de pilha calejado e os olhos do povo à TV, aparelho que traz, lado a lado, a imagem do êxito ou do sofrimento. E quanto mais vemos e ouvimos, dobramos os joelhos ao futebol, o mesmo que nos enraivece, entristece, aquele que faz de nós um felizardo.

Mas se o auge do jogador de futebol é ir à Copa e vencê-la, é possível afirmar que nenhum atleta do mundo anseia tanto a vitória como o esportista que chega a uma Olimpíada. A prova arrebatadora disso são as reações à derrota. O sofrimento do perdedor olímpico é sensivelmente maior que o do jogador derrotado em uma partida decisiva de mundial. Para o corredor, o nadador ou o judoca, fica a sensação incurável de quatro ano inválidos. O boleiro sente, mas dentro de um mês ele terá as mágoas curadas pelos campeonatos nacionais ou continentais. No esporte que conduz uma bola com os pés, a vitória está banalizada. A derrota, também. O boleiro é insensível ao hino. Tudo é muito corriqueiro.


E a frustração da derrota é maior nas Olimpíadas porque o atleta, na maioria das vezes, disputa só. A responsabilidade do sucesso ou do fracasso está sobre as costas de uma pessoa, devotada a vencer o outro e a romper os limites de si mesmo. É claro que há os esportes coletivos como o vôlei, basquete, handebol, mas pergunte aos jogadores dessas modalidades qual o título mais desejado. Ao contrário do jogador de bola, eles dirão que os Jogos Olímpicos são a cereja do bolo. A medalha de ouro será importante à carreira de Neymar, especialmente porque o ineditismo do triunfo torna a consagração mais significativa. Porém, é certo: o atacante santista trocaria a hipotética medalha dourada pela Copa do Mundo sem titubear.

O futebol, por ter um número maior de jogadores e, por isso, a responsabilidade torna-se dividida, não incumbe o seu profissional do mesmo modo que os Jogos. Cabe ao atleta de Olimpíadas atingir o ápice da sua forma física e mental. Qualquer vacilo na preparação ou desvio de concentração custa-lha a medalha, quatro anos de todo o ciclo. Ao jogador é importante estar bem física e mentalmente, mas essa não é condição sine qua non para a vitória, posto que o coletivo pode se encarregar de suprir deformações individuais.

No viés disciplinar, o futebol também perde. A regra já não é clara, como teima em pleitear o comentarista Arnaldo Cezar Coelho. Para piorar, o nível dos nossos árbitros é de medíocre para baixo, e é cada vez mais comum o melhor não vencer por culpa de erros dos juízes. Isso posto, o desrespeito inunda o futebol dentro e fora de campo, tendo-se noção menor de que o jogo é só um esporte. Após o apito final, a vida segue como de costume.


Os esportes olímpicos têm tudo isso muito bem definido. Os eventos são tratados como show, entretenimento, e o público usa o esporte para distração. No futebol, procede-se o inverso: a disputa se apodera do homem e submete-o a práticas animalescas e tribais em não poucas vezes. Em raras ocasiões vemos badernas dentro dos limites da disputa ou nas arquibancadas, quando de uma competição olímpica. A disciplina, inclusive extra-competição, é requisito fundamental para que o praticante seja considerado um atleta. Do contrário, o próprio nível de disputa ou a normatização de cada modalidade se encarrega de abolir o esportista.

O que muito se discute é a legitimidade do futebol como modalidade olímpica. Mesmo com discussões para excluir a disputa entre 22 jogadores, o futebol ficou por um simples motivo: dá dinheiro. O esporte pouco glamourizado em tempos como os atuais converge multidões, pulsa audiência, enche estádios, traz aquilo que os políticos do esporte mais gostam. Disputa? Equilíbrio? Emoção? Não. Lucro.

Mesmo cada esporte tendo as competições mundiais, as Olimpíadas sintetizam o esforço, o páreo e a glória. Nesses esportes, a margem para imprevisto é mínima e normalmente vence aquele que melhor se prepara. Se nos Jogos Olímpicos o atleta cai e chora ou pula e chora, no futebol ele cai, pula, vence, perde, e pouco muda, a não ser para o torcedor, um amante desse esporte imponderável. O apaixonado vibra ou esbraveja pelo seu time e reconhece nas Olimpíadas um evento e tanto.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

POR QUE OS HOMENS NÃO CONSEGUEM FAZER DUAS COISAS AO MESMO TEMPO

A pergunta que as mulheres fazem a nós e a si próprias é: por que os homens não conseguem fazer duas coisas ao mesmo tempo? A pergunta retórica, a prova cabal da nossa incapacidade, tem na história, no início de todo esse enredo à que nomeamos de vida, uma contradição. Se Deus apropriou-se de uma das costelas de Adão para originar Eva, a primeira mulher entre todas, simbolicamente o homem está em dois lugares ao mesmo tempo, fazendo isto e aquilo a todo momento. Mas, não. O homem, de fato, não é capaz de fazer duas coisas ao mesmo tempo.

É evidente que os machos mais desenvolvidos irão bradar um caráter evoluído, afirmando não fazerem parte do grupo de inaptos, quase que proprietários de raciocínio aquém. É possível que haja homens capazes de atuar em duas frentes simultaneamente. Porém, de certo, não o farão com a mesma desenvoltura de uma mulher. O resultado final será diferente, menos eficiente, mais errado, sem beleza. O que não justifica atribuir à mulher os afazeres, e sim aprendê-los. Até para que o homem desfaça a regra e passe às realizações duplas: desempenhar uma atividade prática e contemplar as feições da mulher em descanso.

Passemos por algumas dificuldades masculinas. Falar ao telefone e navegar na internet ao mesmo tempo; dirigir e conversar; dirigir, conversar e escolher a música no rádio? Nem pensar. Temperar a carne e cuidar do feijão sobre o fogo aceso; fazer o churrasco e dar atenção ao amigo na conversa sobre a rodada do Brasileirão; fazer algo com a mão direita e usar a esquerda para outra atividade; trocar de roupa e responder à mãe. Talvez em uma única situação o homem consiga fazer duas coisas ao mesmo tempo, mas o pudor excessivo me impede de dizê-la.


O que explica a limitação do homem diante de duas ações conjuntas? Biológica, física e mentalmente deva haver algum traço concreto que inviabilize a duplicidade do homem. De cara, o único fator que explica a defasagem do homem perante a mulher é o curso da história, essa que costuma esclarecer as dúvidas de hoje, mas tão injustamente desprezada porque “o que aconteceu no passado é passado”.

Ao longo da trajetória humana, o homem sempre foi pragmático. Embora tudo convergisse ao seu entorno e dependesse quase que exclusivamente das suas ações, o macho era dono de si e recusava explicações à parceira. Embora era o membro que saía para trabalhar e permitir o sustento da família e, em casa, resguardava pela segurança física e moral de filhos e esposa, era inquestionável. O resultado a quem blindado está ante críticas é o acomodamento, a lentidão, a possibilidade restrita de dar um passo por vez.

A mulher, não. No tempo em que não trabalhava fora, deveria manter a casa limpa, preparar as refeições, zelar pelos filhos, cuidar da roupa e, uma vez ou outra, providenciar na rua o que a casa se mostrava em falta. Não incomum, a maioria dessas obrigações eram feitas conjuntamente, porque era direito do esposo encontrar tudo nos conformes quando regressasse. A própria Igreja foi responsável por preservar a mentalidade da mulher como ser inferior e, acredite, não eram poucas as mulheres que acatavam essa auto-submissão.


E o feminismo veio. As mulheres ditas subversivas foram às ruas, queimaram sutiãs em praça pública e exigiram uma melhor colocação: os mesmos direitos na política, no meio social, no afeto e no sexo. A mulher violou uma imposição de séculos, reivindicou atuar, trabalhar e cansar em demasia, mas em troca teve independência e mais autoridade em relação ao homem. Os conservadores chiaram. As conservadoras, também.

A vocação libertária faz das mulheres mais atuantes, pressuposto para que a atuação paralela seja viável. Se o homem acomoda-se com o fato de ter alguém que faz tudo, regride. Cabe a ele tirar proveito disso, aprender e evitar que ocupe, agora ele, a posição de inferioridade e dependência. À mulher, o desafio de auxiliar o companheiro e ensinar-lhe como chupar cana e assobiar simultaneamente, com aquele jeito delicado e bravo que só a mulher tem. Olha ela aí fazendo duas coisas ao mesmo tempo de novo. 

quinta-feira, 26 de julho de 2012

MANIFESTO DO CANDIDATO A ELEITOR

Antes de prometer tudo o que irei cumprir, é recomendado que eu me apresente. Meu nome é Thiago Cury Luiz, tenho 28 anos e sou candidato a eleitor. Sou formado em Jornalismo, mestre em Comunicação, professor universitário e publico textos em um blog e num jornal do interior de SP, tudo para externar o muito que tenho na cabeça e não falar sozinho. Porque eu falo sozinho, em voz alta, mesmo escrevendo o dia inteiro. Imagine se eu não botasse no computador ou no papel todos os meus devaneios.

Pois bem. Li bastante, ouvi bastante, vi bastante, o que faz de mim um eleitor mais exigente. Demagogias à parte, quem lê e estuda um pouco tem uma chance a mais de votar melhor, mas isso não é uma regra. Não é raro encontrar analfabetos sábios, coisa que falta a muitos que desfilam por aí com livros embaixo do braço, mas não compreendem o mundo, as relações sociais, as regras desse jogo que não é dos mais simples. Fora isso, mesmo os que melhor votam podem cair no erro, e escorregar numa eleição é grave.

Como candidato a eleitor, prometo rasgar todos os “santinhos”, ignorar qualquer paródia e abominar o slogan que serve como crachá da maioria dos políticos – pelo menos das cidades de pequeno porte – ao pedir voto: “dá uma forcinha pra gente”. Prometo ignorar as promessas impossíveis, o apoio a qualquer candidato a prefeito ou vereador e os churrascos de campanha, bancados por postulantes à política, regados a muita cerveja e nenhum debate. Prometo me manter contra esse sistema, que paga muito aos eleitos, que fazem pouco ou nada nesse intercâmbio.



Prometo também, se eleito for – e já fui pela Justiça Eleitoral –, manter a nulidade do meu voto enquanto não se discutir, com maior maturidade, as prioridades da cidade onde vivo. Prometo questionar por que os políticos de outros mandatos prometem que farão, desta vez, tudo o que não fizeram antes, embora, também antes, prometeram muito. Prometo tentar entender por que, em dia de eleição, o pleito não é protagonista, mas só pretexto para que se abarrotem os bares. Depois, festa de quem venceu, junto aos que neles votaram ou não. Mas, friamente, festa pra quê?

Outra promessa de campanha é tentar entender a causa de tantos candidatos. Pela vontade de mudar o lugar em que mora? Pelo poder? Pelo dinheiro? Prometo protestos contra a falta de segurança, de emprego, de saúde, protestos em prol de que o município dependa menos de repasses federais e estaduais e tenha arrecadação própria. E, quando tiver, que distribua bem o montante para que os serviços atendam a sociedade como é dever.

Pra fechar, eu não prometo mais nada. Pois prometer é uma ilusão momentânea. Façamos, sem alarde. O meu projeto como candidato é esse. Conselho: não acredite. A promessa cansa a expectativa, aborrece a esperança e fortalece o pessimismo. O resgate à memória e às frustrações pode preceder qualquer coisa que seja melhor do que isso que está aí. 

quarta-feira, 25 de julho de 2012

A GLOBO SE LIGA EM VOCÊ. E NAS OLIMPÍADAS?

Extraoficialmente, os Jogos Olímpicos de Londres começam hoje, com partidas, inclusive do Brasil, no futebol feminino. Amanhã, dá-se início à competição masculina, momento em que Neymar e o resto da molecada tentarão, assim como as mulheres, a inédita medalha de ouro, o único título que falta ao time cinco vezes campeão do mundo. A abertura oficial da Olimpíada é sexta, a partir das 17 horas (horário de Brasília), e depois disso serão 17 dias de muita disputa em diversas modalidades.

Para nós, brasileiros acostumados aos fracassos em Jogos Olímpicos, o dado fora dos padrões é que a Globo não transmitirá o evento. A Record pagou 60 milhões de dólares para ter a exclusividade da apresentação em TV aberta, o dobro do que a emissora carioca ofereceu ao COI (Comitê Olímpico Internacional). Resumo: à Globo ficará o direito de transmitir, no máximo, seis minutos (que poderão ser divididos em três programas informativos regulares) de imagens das competições em seus noticiários. Um resquício disso já é observado: mesmo com a proximidade dos Jogos, a emissora pouco divulgou, ainda que sem imagens, inclusive sobre os atletas e equipes do Brasil.

O dilema é grande: negligenciar as Olimpíadas e cometer um deslize jornalístico ou tratar delas e empurrar o seu público à rival? Do ponto de vista da notícia, os Jogos consistem em informações de peso referentes ao jornalismo esportivo, e com as alternativas variadas de acompanhar conteúdos, atualmente é mais difícil enganar o público. Há alguns anos, o que a Globo não transmitia não existia. Hoje, embora ainda soberana, os eventos acontecem, independente da Vênus.


Mas a Globo utilizará só com os seis minutos de imagens e olhe lá. Se o Globo Esporte dura meia hora, não espere que, além dos dois minutos destinados pela Record para a exibição de imagens, Tiago Leifert use outros cinco para falar sobre atletas que brigarão por medalhas logo mais. O limiar da Globo é indigesto, falar ou não do evento, mas a informação está acima de exclusividades ou rivalidades.

O problema é que a emissora dos Marinho costuma escorregar para um lado ou outro. Quando o Pan-americano de 2007, disputado no Rio, foi transmitido pelo canal, os narradores, repórteres e comentaristas fatigaram-se em enaltecer as conquistas brasileiras, como se o Pan fosse referência para alguma coisa. O Brasil foi a Pequim no ano seguinte, só que o sucesso não veio como em 2007. Longe disso. A Globo errou na dose para mais. Quase que certamente, agora errará para menos.

A justificativa dada pelos sacerdotes do jornalismo esportivo global é de que os 30 milhões de dólares oferecidos pela emissora eram o suficiente, e mais do que isso não traria lucro. O fato é que, na Globo, é consenso público que a rival terá prejuízos, posto que os 60 milhões não serão recuperados com cotas de patrocínios. Na Record, é ponto consumado que será possível levantar quase quatro vezes mais do que o valor desembolsado pela exclusividade dos Jogos.


O canal carioca tem algumas cartas na manga. A primeira delas é a transmissão em TV fechada, por assinatura. A Globosat pagou à Record 22 milhões de dólares pelas transmissões. O grupo lançar mão de quantia semelhante à oferecida pela exclusividade, ainda mais para transmissão em canais fechados, soa como arrependimento e um certo desespero. É fato que o número de assinantes de TV paga só cresce, mas ainda incomparável com a audiência dos canais abertos.

Para se ter uma ideia, de acordo com dados da Anatel, são 14,5 milhões de domicílios que contam com TV fechada, ou seja, aproximadamente 48 milhões de brasileiros. Se considerarmos que esse contingente prefere as transmissões dos canais por assinatura, sobraria o triplo dessa cifra cuja única opção é acompanhar as Olimpíadas pela Record. É um desnível considerável.

Os outros dois trunfos da Globo é o Campeonato Brasileiro e Avenida Brasil. Estranhamente, duas práticas se levantam: o Brasileirão-12 não será interrompido durante o evento. Se alguns jogadores irão desfalcar seus times por causa da disputa das Olimpíadas e, com isso, afeta-se o equilíbrio do torneio, o mais recomendado seria interromper a disputa, assim como acontece durante a Copa do Mundo. Os times que não cederam atletas à seleção olímpica, em tese, ficam favorecidos com a continuação do campeonato.

A outra prática é que a novela atingiu o seu ápice justamente a poucos dias do início das Olimpíadas. Se o clímax tivesse vindo antes, cairia na rotina. Se viesse muito em cima dos Jogos, não daria tempo de prender o telespectador. O auge foi colocado no tempo certo. Na atual conjuntura, não seria loucura deixar de ver uma disputa olímpica para presenciar mais uma das vinganças de Rita (ou Nina, sei lá) ante Carminha.


Voltando ao futebol, por exemplo, a Globo já tratou de substituir alguns jogos do Palmeiras por partidas do Corinthians. Tanto o palmeirense quanto o corintiano abandonariam facilmente as Olimpíadas pelos jogos dos seus times. Só que o abandono de alvinegros é em quantidade bem maior do que o alviverde. Durante as noites de quarta e tardes de domingo, a Record não terá vida fácil.

Depois de transmitir com exclusividade os Jogos Mundiais de Inverno (2010), em Vancouver, e os Jogos Pan-americanos (2011), em Guadalajara (México), a Record fecha o tripé das principais competições olímpicas com os Jogos de Londres. Caberá à emissora de Edir Macedo explorar a qualidade das transmissões com bons níveis de som, sinal e imagem, capacidade de narradores, comentaristas e repórteres e, obviamente, a divulgação do evento.

Embora a Globo se desdobre para impedir a supremacia da Record entre os dias 27 de julho e 12 de agosto – o que se apresenta como um desafio dos grandes –, é possível que se observe uma alteração na convergência da audiência a partir de agora. E a missão da Record é essa: fazer com que as Olimpíadas conduzam o público para a emissora e o mantenha fiel mesmo depois de encerrados os Jogos.

terça-feira, 24 de julho de 2012

E SE EU NÃO TIVESSE NASCIDO?

Meu pai teria abandonado a minha mãe e ela não seria a causa da sua dedicação como homem. Ele a teria substituído por tabacos e destilados e sugerido a morte. O aniquilamento de si traria paz ao corpo cansado, mas ao espírito, quem sabe? Minha mãe, sei lá. Teria se fechado ao amor ou aberto o seu coração a todos? Ela saberia viver sozinha, com os olhos duros, mas não sem a lágrima que afaga e machuca ao mesmo tempo. Poderiam ter continuado juntos, e posteriormente a combinação de outro espermatozoide com um óvulo diferente teria gerado um moço melhor ou uma rapariga, talvez.

As Diretas já não teriam vingado. A ideia de democracia seria só isso – às vezes ainda é – e o ano seguinte, mais um de ditadura, e não o fim. Embora sem liberdade, Tancredo não teria morrido. Sarney, sim. Collor, sim. Maluf, sim. Ah, como seria bom se eu não tivesse vindo. A Argentina teria vencido a Inglaterra na luta pela Malvinas. O Brasil teria atacado os hermanos e as tomado para si. FHC não teria sido presidente. Mas se o intelectual não fosse, o que seria de Lula? Se Luiz Inácio não fosse, o que seria do Brasil? Ambos foram bons e ruins, mais um do que o outro, mas a política é isso porque o povo não é além disso. Dilma não seria a primeira mulher a governar o país. Talvez Dilma nem mulher seria. As piadas começam...


O Plano Real não seria nem fumaça. Ficaríamos no Cruzado. A inflação levaria os industriais a quebrarem, os latifundiários a quebrarem, os banqueiros a quebrarem e os trabalhadores a rirem de tudo, quebrados. Porque o brasileiro é solidário e o trajeto para o socialismo estaria feito, irrevogável, até que não fosse necessário mais centralizar o poder na política. Eis o comunismo, em que cada indivíduo tem a consciência do seu espaço, da sua função diante do todo e valores morais, sociais e intelectuais resguardados. Sentimentalismos à parte, os EUA seriam implodidos. Tudo por uma nova rota que unisse os Oceanos Pacífico e Atlântico. O Cruzado seria a moeda global, mas dinheiro para quê, se o mundo virou comunista? Com o comunismo, nada de Windows 95, celular e internet. Mas a cura da AIDS poderia estar aí e o Câncer... Câncer? Eu nasci, e tudo virou mentira. Antes, não.

Lá fora, o velho Bush não teria sido eleito e o filho seria só um menino reacionário, com vontades, sem poder. Mas o mundo precisou ver os Bush para que os EUA elegessem Obama. Sem ambos e Reagan, Barack seria mais um negro. Obama é um negro, é mais um, mas igual a ele, ainda ninguém. A Europa triunfou, a China era agrária, o Japão entendia de tecnologia, a África era miserável. Os nipônicos continuam a entender disso, os africanos também continuam, mas a Europa quebrou, os EUA estagnaram e a China é um emergente que mete medo. Nenhum deles esperava isso, só que eu nasci. Talvez o Muro não viesse abaixo, a Guerra Fria nem tivesse acabado e nada disso aconteceria, ou tudo sucederia igualmente, vai saber.

O Brasil seria potência olímpica. Poderíamos ter vencido mais Copas, mas ganharíamos 94 e 02? A Argentina não levaria o bi a Buenos Aires, Romário não teria feito 1000 gols, Ronaldo continuaria a não ser fenômeno e Messi seria brasileiro. Ah, por que fui nascer? Senna não teria morrido. Tom, Tim Renato, Cazuza, Kurt, idem. Mas, lamento, eu nasci. Se eu não nascesse, Gusttavo Lima, Michel Teló, Luan Santana, o sertanejo universitário, o pagode, as rádios FM também não? Será? A culpa das letras monossilábicas, reprisadas e da melodia pobre recai. Ah, sim. Katinguelê e Karametade não teriam inundado a nossa cabeça com músicas das quais a gente não conseguia se livrar. Mas se eu vim, eles vieram e você, sim.


Atari, Mega Drive, Super Nintendo e PlayStation não existiriam. No lugar, fliperamas somente. Mamonas Assassinas não fariam tanto sucesso e continuariam vivos. Madre Teresa de Calcutá e princesa Diana encabeçariam esse novo mundo comunista, ambas empunhando o martelo, a foice e a foto de Guevara. Dolly não seria clonada, porque cientista que tem um nome a zelar não clona ovelha, clona gente. Nei Matogrosso, William Bonner e Galvão Bueno seriam os escolhidos. A duplicidade de Nei nasceria sem fantasias, o outro Bonner seria o novo repórter de moda da Rede Vida e o clone de Galvão morreria in vitro, após a equipe médica arrepender-se da ideia.

O mundo seria pior ou melhor, diferente ou igual. Com ou sem mim, teria sido tudo. Como tudo seria se você também não fosse fruto de uma noite chuvosa de sexo, com ou sem amor. Independente do mundo ser como é ou como poderia ter sido, você viveu paixões, muitas delas, ou, igual a mim, apenas uma. Se por nenhuma passou ou não quis, por que nasceu?

segunda-feira, 23 de julho de 2012

ANTES DE FALAR DE AMOR, EÇA DE QUEIROZ CONTOU SOBRE TRAGÉDIAS

É que a maioria gosta de bater em bêbado, mas afirmar que só o SBT não tem programas com horários fixos é injusto. Mesmo em menor quantidade, às vezes a Globo não perde a oportunidade de esticar a Avenida Brasil aqui, o Jornal Nacional ali, o futebol da quarta-feira acolá. Não arrisque programar uma gravação: não faltará fita ou HD no seu receptor, mas o conteúdo todo também não estará lá.

Quem sofre com a síndrome dos minutos a mais no espaço do programa seguinte é Gabriela, a novela do horário das 23 horas, da TV Globo. Devido às cenas de nudez e sexo e linguagem com uma ou outra palavra mais ofensiva, a atração vai para o fim do dia. Como vai para o fim do dia também todas as obras ricas da emissora, normalmente os melhores programas. Gabriela pode não ser uma obra-prima como Os Maias, mas é atualmente o melhor que a emissora pode oferecer no gênero da teledramaturgia.

A atração mostra o que era a Bahia da década de 20, mais especificamente a cidade de Ilhéus, e, por que não, o Brasil de antes. Sociedade machista, moralista e hipócrita, em que as próprias mulheres se resignavam com as situações que lhe eram impostas, especialmente no amor. Jorge Amado – e o programa consegue explorar isso – expõe ao público que a política era dirigida pelo voto de cabresto e a Igreja tinha ideia de sobra e ação em falta. Trair a mulher com putas, atitude até sadia. Mas a mulher que pensasse em enganar o marido, um absurdo. Tal mentalidade se arrasta ainda hoje.


Mas a novela peca em três pontos. Embora a obra não traga uma protagonista expressiva no que diz respeito às suas falas, é de se espantar o fato de a mesma não fazer falta à trama, no caso específico da personagem encenada por Juliana Paes. A história entre ela e o parceiro não caminha, e enquanto o fato novo não vier, as histórias periféricas serão mais atrativas.

Outra aresta mal aparada versa sobre o roteiro. Como a quantidade de histórias paralelas é grande e a atuação dos atores também é um ponto forte, acontece de algumas começarem e só continuarem dias depois, o que, convenhamos, é depor contra a cadência do enredo. Ao chamar a atenção dos telespectadores para alguns desníveis é uma forma de diminuir o que a atração tem de melhor.

O terceiro deslize da novela é com relação a uma das obras célebres de Eça de Queiroz, O crime do padre Amaro. Em Gabriela, o romance do escritor português é trazido à tona pela personagem Malvina, interpretada por Vanessa Giácomo. A garota, com perfil revoltado e revolucionário aos padrões da época, encarna a mulher que anseia romper os paradigmas e estereótipos: não aceita a passividade feminina em questões de vestimenta e relacionamentos. Aparentemente algo normal, mas o curioso é que a essência da história é posta de início e abandonada no decorrer da trama. A própria personagem, rebelde e denuncista como a obra de Eça, passa a se referir erroneamente ao livro como um material que “retrata uma linda história de amor”. Tenhamos calma.

Eça de Queiroz, dos mais importantes escritores da literatura portuguesa, pertence ao Realismo. Como característica dessa escola, temos a realidade como ela é, ao contrário das alegorias, do “felizes para sempre” ou do apaixonado morrendo pelo amor não correspondido do Romantismo. Relativo ao período, Eça de Queiroz é para Portugal o que Machado de Assis é para o Brasil. Histórias com vírgulas, sem ilusões, que denunciam as tragédias humana e institucional.


O crime do padre Amaro não apresenta uma bela história de amor. O autor de O primo Basílio e Os Maias nos mostra o homem nas suas entranhas mais desprezíveis e um pessimismo em relação a qualquer perspectiva minimamente boa.

Na história, o sacerdote se aproveita de uma menor de idade (Amélia) e quando a menina engravida, o padre entrega o próprio filho a alguém a quem se paga para exterminar recém-nascidos, tudo em função de manter a própria imagem intocada. Resultado: o bebê morre, a mãe segue o mesmo rumo, após complicações do parto, e o padre sai triunfante. Isso tudo porque Eça tinha um apreço todo especial pela igreja...


Gabriela é uma história e tanto, que se incumbe das regionalidades, de um Brasil atrasado e tem em sua versão televisiva, em formato de novela, atuações imponentes de Antonio Fagundes (coronel Ramiro Bastos), José Wilker (coronel Jesuíno Mendonça), Mateus Solano (Mundinho Falcão), Marcelo Serrado (Tonico Bastos), Anderson di Rizzi (professor Josué) e Laura Cardoso (dona Dorotéia). Mas tropeça em pontos importantes e ofende a literatura e Eça de Queiroz quando atribui à sua obra um mote equivocado.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

BROTOU UM CANAVIAL AO MEU LADO

Getulina, inverno de 2012.

Era uma quinta, e a noite estava de bom tamanho para alguém que não tem muita paciência com o calor. Aquele trecho do ano com temperaturas que fazem escorrer suor pelo corpo e que deixam a pele grudenta, dando a sensação – verdadeira – de que estamos constantemente sujos. Porque o suor tem disso: ele lava a alma e traz para fora as impurezas de sempre. Mas há que se admitir: eis aí uma estação com as suas peculiaridades.

Só que agora é inverno, e a estação que no hemisfério norte acontece entre os meses de dezembro e março reservou na noite de quinta uma das suas. Um parêntese: não acredite em coincidências. O fato de ser inverno nas Américas Central e do Norte e na Europa justamente quando aqui, na África e na Oceania é verão não é obra do acaso. Isso se deve ao movimento de translação e aos 23° de inclinação que a Terra tem em relação ao sol.


Mas essa divagação astronômica só serviu para antecipar a história de hoje, que decorreu ontem. Um bar foi a opção para ver um jogo que nem do meu time era. E pela terceira semana seguida, o Palmeiras enfrentava o Coritiba, agora pelo Campeonato Brasileiro. O resultado final foi 1x1, o que não alterou a ordem das coisas. Os dois seguem na parte de baixo da tabela e o São Paulo mantém-se mal desde 2009. Reconfortante.

Como um convite de amigo não se nega, um bar não é o pior dos locais para se ver um jogo. É claro que muitos dos comentários sobre a partida são risíveis, um bando de gente quer falar ao mesmo tempo, xingar, elogiar, gritar gol, lamentar o tento sofrido, a conversa que cruza o salão para emendar-se com outra mesa. É o emaranhado de informações que faz do torcedor um apaixonado por esse esporte, diferente de qualquer outro, uma vez que o apelo é incomparável.

Como se não bastasse tudo, ao meu lado sentou-se um bêbado. Como sobreaviso, o amigo à minha esquerda proferiu: “Vi esse cara cuspir um pedaço do fígado no hospital. Estava quase morto, parou de beber, melhorou e agora está na fossa outra vez”. Sim, ele estava na fossa, porque o bafo que da boca dele saía arrombou as minhas defesas, e por um momento o álcool dele me cambaleou também. Eu definitivamente estava embriagado por tabela, sem ter ingerido uma gota sequer.


E a criatura desandou a falar. Falava do time, do campeonato, do rival Corinthians. Pior: repetia incessantemente as mesmas coisas. Ouvi-lo e ver a cena não foi dificultoso, mas o cheiro era ingrato. Era a cachaça me dizendo: “você me desprezou a vida toda, me julgou, apontou o dedo àqueles que me tragaram. Suporte as consequências agora”. Era a vingança da birita contra mim. O manguaçado estava ali por um bom motivo. Regozijei-me diante da sua causa, mantendo certa distância, é claro, já que a falta de banho também era notória.

Mas a minha sensação de importunado foi dando passagem à outra reflexão. O que leva alguém a chegar ao estado de embriaguez profunda e diária? Se alguém o faz é porque gosta, mas antes disso há o momento que tenciona a respectiva propensão. O vício, qualquer um deles (em drogas, em sexo, bebida alcoólica, carros, compras, tecnologias, futebol, religião), é resultado de uma falta, que, na visão do indivíduo que se encontra fragilizado, só a prática desregrada de alguma coisa pode preenchê-lo. Qualquer prática em excesso é efeito de uma ruptura.


Sei lá o que pode ter levado aquele homem a beber a ponto de não mais sentir o gole. O juiz apitou o final do jogo, ele ficou satisfeito com o empate, mas não sem antes resmungar uma palavra ou outra, todas incompreensíveis, como se pronunciasse somente consoantes. O vento que vinha de fora trazia, de novo, o hálito daquele ser até mim. Era o fim da quinta-feira, dia de futebol, reflexão e boas risadas.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

DENISE LEITÃO ROCHA, O “FURACÃO DA CPI”, NÃO É O MAIOR PROBLEMA DO CONGRESSO

O vídeo que mostra a assessora do senador Ciro Nogueira (PP-PI) em cenas íntimas é só o símbolo do que de mais trágico acomete a política brasileira desde sabe-se lá quando. Mas antes de entrar no mérito da política, falemos um pouco sobre a tal da intimidade.

O contra-senso talvez nunca esteve tão evidente como agora. Se cada vez mais nós nos isolamos em tecnologias (computadores, celulares, iPhones, tablets, máquinas fotográficas), algumas delas nos expõem a um público muito extenso. As redes sociais nos escancaram, mas elas fazem isso porque o nosso dedinho comanda a mais elementar das ações.

O outro viés dessa conversa são as celebridades, ponto de discussão do programa Na moral, de Pedro Bial, da última quinta-feira, dia 12 de julho. O ator, o músico, o político são pessoas públicas, e o lado bom da fama, como altas aquisições financeiras e a rasgação de seda exagerada, tem a companhia paralela do ônus de ser evidência a todo momento.


Embora não haja relevância nenhuma, alguns internautas são obrigados a se deparar com a “notícia” de que o cara da novela almoçou com a esposa e os filhos no restaurante x ou y. Mas os que não se interessam muito por isso são a minoria. Até aí, se não houver uma invasão deliberada do espaço do famoso, é o tipo de situação com a qual ele necessita familiarizar-se, uma vez que é indissociável.

O problema é a invasão. O cara está em casa e uma criatura sobe na árvore para fotografá-lo (sem contar que, com a capacidade de zoom das máquinas de hoje, nem é preciso colar na pessoa desejada). Ou caminhando pela rua, a celebridade topa com um cinegrafista. Ou alguém com o microfone na mão, mesmo soba negativa da estrela, insiste em coletar um depoimento.

Os conteúdos digitais fazem parte disso, mas podem ser enquadrados em um novo âmbito.   Como a internet abre o risco de se quebrar a barreira entre o que está protegido e a esfera pública, estar atento a anti-vírus eficientes e e-mails suspeitos ajuda a não vermos fotos nossas de mais ou dinheiro no banco de menos.

E, nesse ponto, parece ter sobrado disposição ao “Furacão” para se divertir, mas lhe faltou um mínimo de inteligência. Porque se a precaução não é total e os crimes digitais são difíceis de rastrear, além de não terem legislação específica, melhor curtir o sexo a dois, ao invés de ter como companhia uma plateia repleta. A não ser que isso tenha sido feito com o intuito de se colocar na mídia – o que é improvável e de uma burrice tremenda –, faltou prudência à funcionária de um dos nossos ilustres parlamentares.



A outra ponta dessa história é o fato de tudo convergir na política. Não faltam dedos apontando para a assessora e mencionando o absurdo que é alguém, na posição dela, estar envolvida em uma história dessas. E fatalmente, ao retornar das férias, a dita cuja será demitida do cargo.

Mas de sacanagens o congresso nacional está repleto. Não é necessário alguém expor a imagem do nosso parlamento ao ridículo, mesmo porque os representantes já fazem isso há algum tempo e com performance pra lá de convincente. Cá pra nós, nada fora da normalidade, dos padrões aos quais estamos adaptados.

Uma lei mal votada, uma lei não votada, o dinheiro da corrupção que seria útil à sociedade não são piores do que um vídeo de uma assessora? O lobby, o favorecimento de empresas, a disputa por poder sem um compromisso social não depõem mais contra o congresso? Cidadão sem educação, transporte e saúde de qualidade, sem saneamento básico, com estradas péssimas não atentam mais contra o povo do que cenas picantes de alguém?

O vídeo da assessora, que atende pelo codinome “Furacão da CPI”, é só uma caricatura, um símbolo deformado ou evidente da nossa política. Ela será escorraçada do senado, em nome da imagem casta do congresso nacional. Em prol da imagem nada pura do próprio parlamento, que ela fique. E que um vídeo íntimo não distorça a história: a nossa política não é menos recriminável do que uma pornografia.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

“QUE É A VERDADE?”

Alguns assuntos se levantam como indigestos e diante deles temos a velha mania de criar ressalvas, na tentativa de sairmos impunes de algo que nos apresentou como falíveis, porque todos somos. Ao encobrirmos o erro, nos pretendemos plenos, e está pra nascer alguém que seja assim. Quem se acha incólume, já é carta fora do jogo.

A nossa fuga é invariavelmente no sentido de relativizar a verdade. “O que é verdade pra você pode não ser verdade pra mim” é a frase mais deflagrada no momento em que alguém destoa de outrem, quando o mais simples é apenas discordar. O que diverge são as opiniões, os pontos de vista, as crenças, algo inerente às relações humanas e, em boa parte das vezes, sadio à evolução. Ah, mas quão dura é a empreitada de crescer, da busca incontrolável pelo esclarecimento.

Diante de discursos contraditórios, a verdade está em um dos lados. Ou em nenhum. Dos dois, impossível. A verdade é absoluta e a prova disso é que vivemos no sentido de acertá-la. É a motivação que faz da lida diária o maior dos desafios. A nossa vivência espiritual e carnal, ao longo de anos, traz a experiência, elemento imprescindível para as descobertas, para ultrajar as dúvidas que nos afligem. Mas só ganha e usa a experiência quem sabe e quer.


O que ocorre com a maioria de nós, dos mais jovens aos mais vividos, é que o nosso arcabouço de vida – intelectual, moral e espiritual – pode não estar apto a descobrir a verdade, seja sobre Deus, sobre a vida, sobre a morte, seja sobre o que de mais elementar existe por aí. Mas isso não é irreversível, e ela – a verdade – está lá, inteira, completa, sem dar-se ao trabalho de se desviar do homem, posto que essa criatura já o faz com boa dose de talento.

A pergunta de Pilatos a Jesus é o questionamento de todos nós, a indagação aos outros ou a si próprio, o limiar entre o conhecimento e a ignorância. Se Sócrates – o filósofo, não o jogador – morreu sem nada saber, a nossa tarefa por essas bandas é igualmente árdua. Ainda que não encontremos a verdade aqui ou acolá, saber que ela é concreta pode ser um passo inicial.

IDEIAS PARA O ENSINO DE JORNALISMO

Por Gibran Lachowski,
jornalista e professor de Comunicação na Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat)\Alto Araguaia.


Aproveito a abertura dada pelo dono do blogue para apresentar algumas de minhas ideias atuais sobre ensino de jornalismo, algo que me move tremendamente. São, por enquanto, apenas apontamentos que, com certa facilidade, podem ser aplicados no dia a dia acadêmico, se é que muitas professoras e muitos professores, em parceria com estudantes, já não os desenvolvem. Aos poucos, quem sabe, tais exposições ganhem maior grau de consistência e reflexão.


Entendo ser necessário tornar o ensino o mais próximo possível da prática diária do jornalismo, seja num veículo diário, semanal, quinzenal, mensal...

Creio que isso seja possível a partir de atividades que façam com que o jornalismo esteja grudado na rotina das\os estudantes, para que possam se utilizar de elementos de seus afazeres corriqueiros e do que virem\escutarem\perceberem no cotidiano.

O intuito é tornar o jornalismo algo vivenciado, feito, e não estudado num sentido separado da prática, do exercício profissional.

Portanto, nessa perspectiva, o curso seria uma espécie de agência júnior ou jornal-laboratório o tempo todo, um veículo jornalístico comum em período inteiriço, com reuniões de pauta, coberturas, produção e análises (individuais e coletivas).


A seguir algumas técnicas\alguns mecanismos que podem auxiliar.

Técnicas
Dez minutos de discussão sobre o noticiário do dia toda aula, independente de qual seja e o que tenha como centro de atenção naquele dia.

Discussão do tema do dia\semana com frequência, para avaliar processo jornalístico, julgar tecnicamente trabalho de veículos e profissionais e, também, reescrevê-lo\reeditá-lo\refazê-lo a fim de exercitar novos modos\modelos.

Montar e se utilizar de banco de pautas, feito com sugestões diárias, aula a aula, ou algo assim. As indicações teriam sempre o objetivo de veiculação, ainda que secundariamente servissem como trabalho e nota.

Efetuar o máximo possível de encontros com pessoas que já atuam como profissionais do jornalismo para, em suma, separar a ilusória distância entre academia e mundo do trabalho, mostrando que ambos fazem parte do mesmo todo. E que sejam em variados formatos, como debates, seminários, entrevistas coletivas, palestras, visitas a veículos, contatos em coberturas, trocas de experiências...

Fazer o máximo de aulas-cobertura, a fim de que a reflexão se dê com o exercício do jornalismo. Assim, o apoio docente se fará durante as ocorrências jornalísticas. Produção e velocidade poderão dialogar com ritmo e jeitos de se fazer relativos ao mundo do trabalho.

terça-feira, 17 de julho de 2012

A DOSE, O VOLANTE E A LEI


É ponto pacífico que, de acordo com a lei, ninguém é obrigado a apresentar provas contra si mesmo. Pelo menos é isso que a maior parte dos doutrinadores subentende do Artigo 5º, inciso LXIII, da nossa Constituição. Mas as leis surgem porque o mundo é meio desajeitado, e o homem precisa de algo mais efetivo do que a boa vontade para não sair da linha e, pior, perturbar a ordem de outro. Vamos à Lei Seca.

Coincidência ou não, o nome atribuído à lei brasileira tem como base a homônima americana. Assim como a nossa, a deles veio para controlar o consumo de bebida alcoólica, com a diferença de que lá não havia a atenção para os motoristas, já que o período era o princípio do século XX e a quantidade de carros, mínima. Assim como cá, lá a coisa perdeu força, e os Estados Unidos, entre as décadas de 20 e 60, foram deliciosamente inesquecíveis para os mafiosos italianos.

A nossa lei não impede o comércio de bebida, mas, ao menos em tese, busca punir o motorista que bebe e apresenta risco aos demais condutores ou pedestres. Só que não é dever desse motorista fazer o teste que irá ou não comprovar teor alcoólico acima do permitido. Como pena pela negativa, suspensão da CNH por 12 meses, retenção do veículo e multa de R$ 957,70. Para quem soprar e acima do nível tolerado estiver, mesma multa, apreensão do automóvel, proibição de dirigir durante um ano e sete pontos na carteira.


Em suma, bem menos prejuízo fazer o teste e ser pego do que recusar-se. Mas a velha prática do “não me toque” vem para inverter o ordenamento de tudo, e coitadinho do beberrão que é afrontado e o cidadão sem álcool que seja menos pragmático e arque com a possibilidade de um ônus maior do que um teste de teor alcoólico. Algo semelhante ao episódio da lei anti-fumo. Boa parcela dos fumantes, à época, se doeu quando ficou definido que em ambientes fechados não seria mais permitido fumar, por um motivo muito elementar: quem não fuma quer o seu direito resguardado. Hoje, cada público tem as suas manias preservadas sem incomodar os de opiniões contrárias.

Mais pontual do que essa história toda seria, além de todas as penalizações, o acréscimo de pontuação na nova carteira e a detenção desse condutor, caso seja pego novamente em condições de embriaguez ou se negue a realizar o teste, embora essa mesma criatura possa complicar a vida de outra pessoa na primeira vez que exagerar no copo e se meter a dirigir sem as condições básicas.

Beba a sua cerveja, fume o seu cigarro, porque de moralismo o mundo já é ofegante. É fato que os puritanos aborrecem por reclamar de graça, mesmo que a esbórnia não lhe afete. Só que quando o limite entre o exagero e o outro é ultrapassado, quem dá chiliques gratuitos é o metido a transgressor.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

NÃO TEM DADO CERTO TORCER CONTRA

Se eu dissesse que torci, ensandecido, contra Corinthians e Palmeiras, nesta última semana, seria uma verdade hedionda. São-paulino que se preza torce para que os rivais percam, com requintes de crueldade se possível, assim como a recíproca é mais do que verdadeira. Até por isso, não venhamos com o complexo de vítima, do “todos contra nós”, porque isso é do futebol e é o que move a paixão do torcedor mesmo quando o seu próprio time não está em campo. Secar o rival não é um luxo desse ou daquele torcedor, assim como o monopólio do sofrimento não torna heróico um só clube, posto que torcer e sofrer formam uma dupla e tanto e acometem qualquer um, seja de onde for, que aprecia uma bola de pé em pé, um golaço ou um chutão pra longe.


Se eu dissesse que a tristeza de ver os dois principais rivais triunfarem foi imensa, também não seria mentira. Em épocas de vacas magras, em que o quarto ano parece se encaminhar para aumentar o jejum tricolor, notar corintianos e palmeirenses vibrando é ruim e incita aquela ponta de inveja. Em determinadas circunstâncias, ver o adversário no chão pode ser melhor do que um êxito pouco empolgante do próprio time. Mas, após inúmeros insucessos, o Corinthians conquistou a tão sonhada Libertadores e o Palmeiras chegou a um título de expressão depois de 13 anos. Não há nada que possa ser feito contra o que está consumado. Os gigantes estão ativos e as camisas que entortam varal, frase de um autor que desconheço, colocam-se ainda mais fortes.


A cada gol perdido pelo Coxa, a cada pressão do Boca frustrada era uma esperança a menos, uma certeza a mais de que a minha torcida, assim como para o São Paulo, não surtiria efeito. Riquelme e Everton Ribeiro decepcionaram, porém nada comparado ao que Luís Fabiano e Lucas protagonizaram, além de todos os que desde 2009 representam tão mediocremente o time. Mas nada que esteja tão ruim que não possa piorar, e a diretoria são-paulina dá um show de incompetência e antidemocracia. Como desgraça nunca é de mais, o semestre não poderia se desenhar pior ao tricolor, com Corinthians, Palmeiras e Santos erguendo taças. Eis um duplo fracasso: não ganhar nada, ao passo que os principais oponentes faturam títulos importantes.


Mas olhemos o todo com menos paixão, aquela que costuma cegar e ceifa o esclarecimento. O time corintiano é, do ponto de vista tático, dos melhores que surgiram no Brasil nos últimos anos. Tem organização e disciplina táticas, coisa tão rara nos jogadores brasileiros, que supõem ser superiores aos demais, fato hoje não observado com tanta facilidade como antes. Isso posto, talvez pela primeira vez na história seja possível arriscar que não há favoritismo do time europeu em relação ao sul-americano, prováveis finalistas do mundial de clubes, em dezembro. As disparidades tática e técnica que normalmente se mostram, entre Chelsea e Corinthians praticamente inexistem. O problema é o desmanche que parece assombrar o alvinegro paulista.



Já o Palmeiras é o inverso quando o assunto é disponibilização tática. Embora empenho não falte, além de possuir jogadores individualmente inferiores, no cumprimento da função tática seus atletas também não são dos melhores. Mas o alviverde tem uma bola parada impiedosa, e pode parece lugar comum, mas a dita cuja vence jogos aos montes. E o Palmeiras foi à final assim e despachou um time que, grosso modo, é melhor. Escorando-se nisso, não são poucos os que dizem que o time venceu sem merecer, mas quem bota a bola na rede é merecedor da vitória, amigo leitor. Se o Palmeiras não pressionou, mas fez dois gols, o mérito está aí, e não em criar chances e não convertê-las. O bicampeonato da Copa do Brasil veio, junto com a vaga para a Taça Libertadores.


         
          Os hinos do “campeão dos campeões” e do “alviverde imponente” entraram na mente do rival acuado e perturbaram as previsões dos secadores outrora otimistas. A máxima do “todos contra um” sempre existirá, porque pode parecer contraditório – e é, de fato –, mas a massa empurra o time estrangeiro ante o brasileiro ou, em duelos caseiros, incentiva o mais frágil, o clube menor, com menos tradição. Mesmo quando o normal seria desligar a TV e dormir, a ânsia de ver o adversário ruir chama o secador a acompanhar o jogo quieto, sem alarde, mas doido de vontade de berrar quando o time, por quem não tem o menor afeto, faz um gol, elimina o arqui-rival e tira deste a taça de campeão. Mas quem marcou o tento e levantou o troféu foram corintianos e palmeirenses, enquanto o são-paulino aqui permanece na fila, zombado por não ter, por hora, um time vencedor.