Quando a morte se
agiganta, temê-la, resignar-se ou cumprimentá-la? Sendo o projeto mais certo da
vida, a morte tira do homem aquilo que mais ama. Embora repleta de prejuízos, a
vida terrena permite aos mortais privilégios irrecusáveis, em sua maioria de
ordem material. É quando o ser busca recursos diversos, como cirurgias
plásticas, alimentação regrada e a religião, na tentativa de adiar o fim. Mas o fim é
inexorável e ele chegará a mim e a ti, seja agora, no momento em que lê este
texto, ou depois.
A dúvida do que
virá a seguir angustia o homem que, embora pense muito, é incapaz de esclarecer
o mistério. As religiões poderiam trazer as respostas, mas, conforme-se: elas também
são formadas por homens, e a nossa limitação, enquanto seres carnais, manterá
uma incógnita. A interrogação pode nos atrapalhar, confundir os raciocínios,
mas se ela for útil para realizarmos melhor o nosso papel, justamente por termos
uma noção pouco nítida acerca do porvir, já será qualquer coisa positiva.
Pragmático que é,
o homem se amedronta com as possibilidades posteriores incertas. É evidente que
você e eu, após morrermos, podemos encontrar Jesus, Madre Teresa e Gandhi, isso
se o nosso destino for os céus. Porque se a danação eterna nos espera, o mais
manso dos condôminos do inferno será Hitler, uma criatura que, para os padrões
do capeta, é de uma sensibilidade enorme. Se a partida preceder o encontro com
o austríaco, não hesite em achar que algo não muito bom tenha sido obra sua. Se
desembarcar por aquelas bandas, tenha certeza: haverá maldade, escuridão e
seres assustadores, mas prepare-se para mais, porque de assanhamento despudorado
o inferno está tomado.
Deixemos o
inferno de lado, pois se você lê este texto e acessa o blog diariamente, é
ponto consumado que o seu destino é o paraíso. Pobre daquele que não aderiu ao
costume de vir aqui todos os dias... Como seriam os encontros pós-vida, se o
corpo ficou aos bichos? Perceba que o nosso inconsciente tenta reproduzir na
morte características da vida. E se a carne ficou, a nossa inteligência e
memória também serviram de comida a seres minúsculos. Se tudo isso é enterrado
ou cremado, o homem não será nada no além, a não ser que raciocínio e lembrança
sejam também ou somente de ordem espiritual.
Ainda vivos,
amedrontamo-nos com a ideia de não haver nada depois. Repugnamos a
possibilidade de adormecer e só. Viver tanto, passar por inúmeras experiências,
usar a inteligência para viabilizar maturidade ao espírito, e simplesmente
apagar e não ter mais nada? Essa chance perturba o bom senso, faz com que
alguns se acomodem nela, mas raros os que não pensam nisso.
Quando a morte
não nos é, pega alguém próximo. Na juventude ou na velhice, não há uma que seja
bem-vinda. Esta ou aquela pode doer mais, arranhar o sentimento dos que ficam,
mas a perda é inconsolável. Quando alguém próximo se vai, uma parte da nossa
história se afunda e não mais volta. Leva pra debaixo da terra um pedaço de
quem ficou e aborrece quem respira, até o espírito – de novo ele – acalmar-se,
conformar o físico, arrefecer a mente e vida que segue.
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