terça-feira, 7 de agosto de 2012

O BELO E O INSALUBRE DA VIDA ESTÃO NO LABIRINTO E A CÉU ABERTO

As cidades grandes importunam o interiorano. Ao perder-se em meio a arranha-céus, ao trânsito impossível, às etnias que se esbarram, ao barulho que perturba, desespera-se. Ele está em um local onde as referências se distanciam, porque as novidades, em quantidades cavalares, afetam a memória. O caipira está perdido, como se a imensidão de tudo fosse desabar e qualquer tentativa de fuga é em vão. O emaranhado de desorganização aborrece o bom senso dos que funcionam à manivela.

O interior, todavia sem a “dura poesia concreta de tuas esquinas, a deselegância discreta de tuas meninas”, tem bala na agulha e, ao seu modo, também pode atrair o encantamento e o desprezo. Mesmo sem o arsenal de opções da sua antítese, não há quem passe ileso a um vilarejo, uma ruazinha de paralelepípedos ou às vias sem mão única tomadas por botecos e cães vira-latas. A natureza é escancarada e respira-se verdadeiramente.


A calmaria das cidades que finalizam o mundo pode servir aos extasiados psicologicamente como água ao sedento, mas quem habituado está à efervescência, estar onde as novidades tardam a chegar pode enlouquecê-lo muito mais do que cruzar uma larga avenida paulistana de olhos vendados. Tudo aparenta vazio, monotonia, inatividade. Nada muda, e isso incomoda o mais tenso, igual ao homem que regressa da guerra e não tem quem matar.

A inexistência de dinamismo reforça a ligação entre as pessoas, a proximidade de cada um com o todo. Quase tudo o que acontece é de comum conhecimento, palpável ao mais desprendido, ao mais curioso. A sensação de pertencimento ao outro, de controle do outro faz das histórias, coletivas. O que sucedeu a você, chega a mim, e me sinto à vontade para comentar, questionar e julgar o que você fez e falou ou o que deixou de fazer e falar.


É a intromissão, o “cuidando da vida alheia” impondo-se, e apresenta-se na outra ponta da linha a prontidão em ajudar o vizinho, ao contrário da frieza metropolitana em que todos se desconhecem. A falta de privacidade em bandas interioranas constrói casas sem muros, sem cômodos, com imensos buracos de fechadura, de janelas sempre indiscretas.

A compaixão e o zelo dos confins não equivalem ao sossego, à garantia de que situações de ordem particular não se transformem em domínio público. Mas a indiscrição pode encontrar no outro uma vontade de estar em evidência, no falso sentido que a ideia “falem mal ou bem, mas falem de mim” pode compartilhar. Entre o pacato e o frenético cotidiano, mais difícil do que cravar o melhor, é habituar-se às saliências deste ou daquele lugar, que nos testam, intimidam, estraçalham ou cedem.

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