quarta-feira, 1 de agosto de 2012

O MENSALÃO E O FOLCORE POLÍTICO BRASILEIRO

A partir de amanhã, o STF (Supremo Tribunal Federal) terá dias atípicos. A mais alta corte jurídica do país começa a julgar o mensalão, esquema de corrupção que envolveu desde bancos e empresários a integrantes do alto escalão do governo federal durante o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Além da questão política, há o componente midiático, porque sem ele tudo seria mais normal, embora a ocasião esteja mais para repercussão do que calmaria.

Antes de falar especificamente da imprensa, passemos pela carga que a mesma tenta dar ao ocorrido, obviamente a buscar uma evidência ainda maior do que o próprio caso implementa. Todavia discutível, o mensalão pode até ser o maior escândalo da política brasileira em toda a sua história, mas a irregularidade não ocupa o primeiro lugar sozinho. Vejamos por quê.

A corrupção é a irmãzinha caçula da política nossa de cada dia. Atrelado a ela – à corrupção – vem o que se convencionou chamar de escândalo. E, cá entre nós, eles não são poucos desde que os portugas pisaram na Bahia pela primeira vez, encararam os índios, riram muito no princípio da colonização e depois trataram de dizimar o contingente indígena que já se encontrava aqui há um bom tempo.


Mesmo fora da política formal, talvez este tenha sido o primeiro insulto de ordem política vivenciado no Brasil: à força, os lusitanos ocuparam um espaço já em uso por outro povo. A partir daí virou bagunça, e não culpemos o clima, as praias, as mulatas, o samba. Em outros locais existem belas músicas; mulheres que estonteiam; sol, chuva, calor e frio em doses boas; e o disparate é mais contido.

Até onde a memória de um não-historiador pode buscar, lembremos da independência, em 1822. Além de tardia, teve como principal mandatário o filho do Rei, ex-maior autoridade do Brasil. Na sucessão de D. Pedro I temos o segundo na linha sucessória, que assume o posto de imperador com apenas 14 anos, no ocorrido que se denominou Golpe da Maioridade.

Um asterisco ao filho de D. João VI. Se os Estados Unidos aderiram ao regime republicano já em 1776, após libertarem-se da Inglaterra, o Brasil trouxe a República apenas em 1889 para suceder o regime imperial. Embora com maior caráter social, mencionemos a atrasada abolição da escravatura, assinada um ano antes, tardada pelo interesse dos políticos na agroexportação.


Se a nossa república nasceu militarista, no acender das luzes do século XX tivemos a alternância na presidência entre paulistas e mineiros e a chegada golpista de Getúlio Vargas para romper, mesmo sendo derrotado por Júlio Prestes, a política do café com leite. O presidente mais longevo da nossa história viria a se matar em 1954, já em seu segundo mandato.

Depois disso, a Ditadura de 64. Revolução? Não. Golpe. O mais triste escândalo entre todos por que passamos. A morte de Tancredo pode ter sido fatalidade, mas a subida de Sarney, complicou. O impedimento de Collor foi outro baque. E depois, menos graves, vieram as privatizações com FHC e o mensalão com Lula. Fora o que ficou além da lembrança.

Ponto em comum de tudo isso? As nossas duas principais vocações: ter políticos e eleitorado péssimos. Se fôssemos melhores no voto, os piores representantes não estariam lá e a condescendência diante de descalabros seria menor e maior seria a luta por melhores escolas, condições de moradia, segurança e acesso a serviços de saúde.


A diferença entre todos os escândalos e o mensalão é a cobertura da imprensa, afiada como nunca. Haverá uma incidência considerável de notícias, notas, comentários e opiniões no noticiário de todos os veículos. À medida que o assunto cresce no seio social, pela ênfase do agendamento midiático, a audiência aumenta e entra em cena a espetacularização do fato. Isso preocupa.

As câmeras serão inúmeras, o foco quase que exclusivo e concorrência na preferência pública com as Olimpíadas podem desequilibrar a isenção. E a expectativa de que a vaidade dos ministros não seja afetada, prejudicando o julgamento. Cairemos numa contradição? Apesar da importância da imprensa em divulgar fatos de interesse público, o exagero disso pode afetar o acontecimento em si.

Se a Record tem os Jogos Olímpicos, a Globo e as outras terão o mensalão. A divisão em capítulos, a transformação do real em drama fictício e a vulnerabilidade ou não da Suprema Corte brasileira podem dar as caras a partir de amanhã. Enquanto Dirceu, Jeferson, Delúbio, Valério e o resto forem julgados, o povo julgará os ministro do STF e o jornalismo. E a história irá julgar todos eles, inclusive o povo, se algo fugir do que deve ser feito.

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